Proposta que indenizará proprietários de terra em áreas indígenas
segue para a Câmara; Cardozo diz que não é solução e aponta alta
judicialização como causa dos conflitos
Deputado lê texto da PEC 71 (© Alan Azevedo / Greenpeace) |
Greenpeace Brasil
Foi aprovado na noite da última terça-feira (8) pelo Senado Federal a
Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 71/2011, que prevê a
indenização a proprietários rurais com áreas incidentes em Terras
Indígenas. Aprovado de forma unânime em dois turnos, a proposta segue
agora para a Câmara dos Deputados.
O texto aprovado destina compensação apenas aos títulos de terra
obtidos de “boa-fé” que se sobrepõem a Terras Indígenas homologadas após
5 de outubro de 2013. A PEC 71 também prevê que o pagamento deverá ser
feito antes de o produtor rural deixar a terra.
O relator do texto, senador Blairo Maggi (PR/MT), acatou a sugestão
de última hora do senador Roberto Requião (PMDB/PR) para incluir no
projeto a possibilidade de indenização também por Títulos da Dívida
Agrária (TDA), caso seja de interesse do beneficiado, além do pagamento
em dinheiro.
Reunião extraordinária
O Ministro da Justiça José Eduardo Cardozo aceitou convite de
parlamentares para participar de uma reunião realizada ontem (9) na
Câmara sobre os conflitos indígenas que vêm ocorrendo em todos os
Estados, especialmente no Mato Grosso do Sul, e as ações do Governo
Federal pela segurança jurídica de produtores e indígenas.
Segundo Cardozo, a maioria das Terras Indígenas do Brasil que não
apresentam conflito foram homologadas, sendo que as áreas remanescentes
são ocupadas por proprietários com títulos muitas vezes emitidos pelo
próprio governo.
“O conflito judicial acaba sendo quase inevitável nessa disputa, seja
contra a demarcação ou seja a favor. Muitas vezes a simples abertura de
um processo de identificação já é judicializado. Isso traz uma grande
insegurança jurídica, fazendo com que os conflitos se arrastem por
décadas. No caso dos Pataxó, no sul da Bahia, por exemplo, temos um
processo tramitando há mais de 30 anos”, explicou o ministro da Justiça.
Para ele, esse foi justamente o problema que desencadeou a crise no
Mato Grosso do Sul, onde uma liminar foi dada há dez anos atrás,
travando a homologação da TI Ñande Ru Marangatu – liminar que nunca foi
julgada no mérito. Saiba mais sobre o episódio aqui, que terminou na
morte da liderança indígena Simião Vilhalva.
“As delongas pelo término de um processo arrastam a crise e ensejam
conflitos físicos onde há mortes. Por isso começamos, já há dois anos,
desde o episódio da morte do indígena Oziel Gabriel, ocorrido na Fazenda
Buriti, no Mato Grosso do Sul, o que chamamos de ‘mediação para
conflitos indígenas’”.
O ministro comentou sobre a aprovação da PEC 71 pelo Senado e também
sobre a inconstitucionalidade da PEC 215, que prevê a transferência da
responsabilidade de demarcar Terras Indígenas do Poder Executivo ao
Legislativo. “Conversei com o relator da PEC 71, o senador Maggi, ontem
mesmo. Falei que precisavam mudar o texto, mas foi aprovado mesmo assim.
Eu não acho que seja a solução, pois vai haver ainda mais
judicialização”, ponderou Cardozo.
Sobre a PEC 215, o ministro explicou que é inviável nos termos da
Constituição, pois a transferência de poderes entre o Executivo e
Legislativo fere cláusula pétrea.
Em resposta, o deputado Osmar Serraglio (PMDB/SC), relator do texto
da PEC 215, rebateu o ministro dizendo que a Constituição prevê que é
prerrogativa do Congresso definir limites dos bens da União, como
territórios indígenas. Cardozo contestou: “o Legislativo pode definir
limites, é sua função, mas não pode executar como o Poder Executivo.
Esse ponto é inconstitucional”.
O deputado Ivan Valente (PSOL/SP) disse que o governo demarcou poucas
terras indígenas desde a Constituição Federal, apenas 1/3 das terras
indígenas, e cobrou um diálogo maior para solucionar os conflitos. “Sou
favorável à indenização ao pequeno agricultor de boa fé, e não ao
grileiro”, disse Valente.
A próxima semana será marcada pela apreciação da PEC 71 pela Câmara
dos Deputados e o avanço das negociações pela votação da PEC 215 pelos
deputados.
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