“A nossa luta continua, Ka'apor! Não foram caminhões, nem tratores e nem motosserras. Não serão cercas de arame e nem pistoleiros que vão nos impedir de proteger e viver em nosso território, em nossa floresta”
Povo ka'apor
Entre 2013 e o último mês de março, fechamos todos os ramais de
entrada de madeireiros que invadiam e destruíram nossa floresta, nossa
casa. Nesse período, criamos oito Ka'a usak ha, ou Áreas de Proteção
para recuperar, proteger, viver de forma sustentável em nosso
território. Depois de iniciar muito forte a fiscalização, limpeza de
nossos limites, encontramos madeireiros, fazendeiros, estaqueiros,
caçadores e posseiros que usavam nosso território sem autorização da
gente.
Esses agressores usavam e usam os limites ou áreas dentro de
nosso território com permissão de funcionários da Funai, de prefeituras,
do INCRA e de sindicatos para tirar madeira, colocar pastos, colocar
roças grandes, tirar estacas para fazendas, para movelarias, para
cerâmicas, para panificadoras nas cidades. Entravam principalmente para
derrubar árvores, tirar a madeira e capturar animais. Nunca as
fiscalizações do governo (IBAMA, Policia Federal, Funai, Exército)
conseguiram resolver e acabar com esses tipos de destruição.
Por isso que nós, por conta própria, resolvemos nos organizar,
defender e proteger nosso território. Começamos fiscalizando e limpando
nossos limites, quando identificamos as áreas de maior destruição. A
partir daí iniciamos o nosso etnomapeamento que ajudou a gente
identificar todos os limites do nosso território, fazer vários mapas de
nossa área. Esse trabalho ajudou a gente identificar tanto as áreas
destruídas quanto os grupos e pessoas que entravam, entram e destroem.
Vimos que a melhor maneira para evitar o aumento dessa destruição
foi morar nessas áreas destruídas para recuperar, plantando espécies de
árvores que tinham antes, para os animais voltarem a viver ali e a
gente ter caças para o nosso alimento, os pássaros voltem a viver nessas
áreas para a gente criar e tirar suas penas para fazer nossas roupas
tradicionais (cocares, braçadeiras, pulseiras, colares), proteger da
entrada desses invasores e plantar pequenas roças com diversas culturas
produtivas para a gente ter bastante e diversos alimentos para gente
ter um bem viver. Mas, depois que a gente criou essas áreas de
proteção, agora, depois de dois meses, a gente vem sendo impedido,
perseguido e até ameaçado de entrar nessas áreas por fazendeiros,
pistoleiros, posseiros (incentivados por madeireiros e fazendeiros),
alguns assentados do INCRA que, pressionados por madeireiros e
fazendeiros, têm vendido seus lotes para fazendeiros e madeireiros,
permitido a destruição de suas reservas para retirada de madeira, para
grandes extensões de pastos.
Isso está acontecendo principalmente nos municípios de Centro do
Guilherme, Maranhãozinho, Santa Luzia do Paruá, Nova Olinda do Maranhão,
Araguanã e Zé Doca. Todos esses municípios fazem limites com nosso
território. A gente está preocupado porque eles estão impedindo e
ameaçando nossas famílias de proteger essas áreas, sair para outras
aldeias, ir para cidade quando precisam. Prova de tudo isso, a gente
continua vendo madeira e estacas saindo de um ramal que foi reaberto por
madeireiros no município de Nova Olinda do Maranhão.
A gente vê serrarias em Zé Doca, Araguanã, Santa Luzia do Paruá,
Centro do Guilherme e Governado Nunes Freire (Encruzo) funcionando com
muita madeira em seus pátios que sai dessas áreas, nesses municípios. As
serrarias do município de Encruzo nunca pararam de funcionar. A gente
não vê nenhuma fiscalização dos governos nestes locais. Desde a semana
passada, nossos parentes viram pessoas (pistoleiros) com armas tipo
pistola perto de nosso cemitério na entrada da Aldeia Ximborenda, aldeia
que nosso parente Eusébio Ka'apor morava.
Na última segunda-feira, dia 21 de setembro, seis homens em três motos foram vistos armados na estrada
de entrada da aldeia Ximborenda. Um estava visivelmente armado. A
polícia nunca prendeu o assassino que matou Eusébio e mais parentes
estão correndo perigo na entrada de nossas áreas de proteção e das
aldeias. A gente não aceita que a violência desses agressores continue
impedindo a gente viver com dignidade em nosso território. Por isso que
nosso povo está vigilante, atento e unido para defender nosso
território, nossa verdadeira casa que é a floresta.
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