19 de outubro de 2013

Organizações Yanomami do Brasil e da Venezuela lançam carta aberta em evento binacional

A Hutukara Associação Yanomami (HAY), do Brasil, e a Horonami Organização Yanomami (HOY), da Venezuela, promoveram seminário para discutir avanços e retrocessos das políticas públicas dos dois países. Um ato pelos 20 anos do massacre do Haximu foi realizadou
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O seminário Direitos Indígenas y políticas nacionales: analizando el caso de los Yanomami de Venezuela y Brasilaconteceu na cidade de Puerto Ayacucho na Amazônia venezuelana entre 7 e 11 de outubro, com a presença de representantes do governo e da sociedade civil dos dois países. Do Brasil participaram Funai (Fundação Nacional do Índio) e Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena). Da Venezuela participaram Caicet (Centro Amazônico de Investigação e Controle de Enfermidades Tropicais), Direção Regional de Saúde do Estado Amazonas, Coordenação de Saúde Indígena do Amazonas, Distrito Sanitário Alto Orinoco, Centro de Antropologia do Instituto Venezuelano de Investigações Científicas (IVIC), Unicef Venezuela, além das organizações indígenas Orpia, Oipus e Kuyuhani, entre outras. O ISA e a Associação Wataniba (Venezuela) foram parceiras no evento.
Os temas principais em debate foram Direitos Territoriais, Garimpo e Mineração e Saúde, abordados numa perspectiva binacional pois, como expresso na carta aberta, “é importante que os governos entendam a relação estreita entre saúde, terra e presença de mineração. Não é possível ter uma boa saúde se não temos o nosso território protegido. Da mesma forma é importante compreender que para nossa boa saúde e para a proteção do nosso território é preciso que existam ações conjuntas dos dois governos e que incluam a participação das organizações indígenas.” (Leia no final do texto a carta aberta na íntegra).
Haximu 20 anos
Durante o seminário houve um ato público para rememorar o massacre de Haximu, que completou vinte anos em 2013. Naquela ocasião, garimpeiros brasileiros assassinaram 16 Yanomami na Venezuela. Em sua maioria, eram mulheres, velhos e crianças.
O diretor da Hutukara, Dário Kopenawa, disse que este caso não sairá da memória dos Yanomami e será sempre lembrado durante a luta por seus direitos, enfatizando que até hoje, depois do massacre, a Terra Indígena continua invadida por garimpeiros.
A advogada do ISA Ana Paula Caldeira reforçou que embora o massacre de Haximu tenha sido o único caso julgado formalmente pela justiça brasileira como genocídio, os culpados não foram condenados à altura de maneira que em 2012 o garimpeiro Pedro Emiliano Garcia, envolvido no massacre, foi novamente preso dentro da Terra Indígena Yanomami em operação da Polícia Federal para combater o garimpo. (saiba mais).
Carta Aberta dos Yanomami da Venezuela e do Brasil
Puerto Ayacucho, 11 de outubro de 2013
Nós, Povo Yanomami do Brasil e da Venezuela, representados por nossas organizações “HORONAMI Organização Yanomami” e “HUTUKARA Associação Yanomami”, reunidos em Puerto Ayacucho, estado Amazonas, Venezuela, de 07 a 11 de outubro de 2013, realizamos um Fórum para lembrar dos 20 anos do massacre dos Yanomami de Haximu (1993) e o Seminário Binacional “Direitos Indígenas e Políticas Nacionais”. Nestes dias de reflexão chegamos às seguintes conclusões:
1. A luta dos povos indígenas da Venezuela e do Brasil foi importante para que os nossos direitos fossem escritos nas Constituições da Venezuela e do Brasil. Apesar disso, queremos que os governos façam valer esses direitos implementando políticas públicas que garantam a integridade de nosso território e modo de vida. Apoiamos também a campanha “Mobilização Indígena” realizada no Brasil, que faz um chamado nacional para que os povos indígenas sejam respeitados e seus direitos constitucionais garantidos.
2. Ao lembrar dos 20 anos do massacre de Haximu, onde foram assassinados 16 Yanomami (em sua maioria mulheres, velhos e crianças) na Venezuela por garimpeiros brasileiros, queremos chamar a atenção de nossos governos para que sejam tomadas medidas efetivas para acabar com a presença de garimpeiros e assim evitar que novos casos venham a se repetir.
3. Pedimos que sejam respeitados os direitos originários que temos sobre nossas terras e que são reconhecidos nas duas constituições, realizando a demarcação das terras dos Yanomami e Ye’kuana na Venezuela e da proteção da Terra Indígena Yanomami (TIY) já demarcada no Brasil. Solicitamos também que a demarcação dos territórios indígenas na Venezuela seja feita respeitando nossa unidade territorial como povos. No caso do Brasil, é necessário que o governo retire os fazendeiros que ainda estão dentro da TIY.
4. São muitas as denúncias sobre garimpo que nossos parentes nos trazem. E a situação é muito grave na região de fronteira entre Brasil e Venezuela, onde estão instalados acampamentos de garimpo que produzem violência, epidemias, destruição de nossas terras e contaminação de nossos rios. É urgente que os governos brasileiro e venezuelano planejem e executem ações conjuntas para acabar e controlar o garimpo em nosso território. Além do garimpo, também estamos preocupados com a intenção dos governos dos dois países de explorar os minérios de nossa terra. No caso venezuelano sabemos da intenção do governo de explorar minérios em convênio com a empresa chinesa “CITIC” nos rios Ocamo (Alto Orinoco) Parágua, Caura y Ventuari, dentro das terras dos Yanomami e Ye’kuana. No Brasil, também somos contra qualquer regulamentação que imponha a mineração em nossas terras. Exigimos que nos consultem sobre este projetos e manifestamos que somos contra eles porque a mineração ameaça nossas vidas.
5. Apesar dos esforços dos governos, em nossas comunidades a situação da saúde tem piorado muito devido a deficiências no programa de atenção à saúde e a presença de garimpeiros que trazem epidemias e contaminação. Pedimos às instituições públicas responsáveis dos dois países que melhorem os serviços de saúde destinados aos yanomami, incrementando a formação de agentes de saúde yanomami, o fornecimento de medicamentos necessários e o controle social efetivo. Na Venezuela é urgente a ampliação dos serviços de saúde para as comunidades de difícil acesso. Pedimos também que participemos do planejamento e da execução das ações de saúde. Da mesma forma é muito importante implementar ações binacionais conjuntas nas regiões de fronteira.
É importante que os governos entendam a relação estreita entre saúde, terra e presença de mineração. Não é possível ter uma boa saúde se não temos o nosso território protegido. Da mesma forma é importante compreender que para nossa boa saúde e para a proteção do nosso território é preciso que existam ações conjuntas dos dois governos e que incluam a participação das organizações indígenas.

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