30 de junho de 2014

Pataxó na Copa: "Esse Brasil só faz a gente sofrer mesmo"

Nitinawã Pataxó defuma o aparelho de TV com incenso _ Leo Burlá


Por Tereza Amaral

O que deveria ter sido um jogaço e uma passagem mais tranquila da seleção brasileira para as quartas de final foi um sufoco inusitado para indígenas da reserva em Porto Seguro (BA). Eles assistiram a Copa pela primeira vez na televisão.

No ponto de chegada dos portugueses ao Brasil, a partida entre Chile X Brasil foi vista pelos indígenas em meio a ostras frescas, paçoca de mandioca, incenso no entorno do aparelho de TV e até cânticos na disputa dos pênaltis. 
O aparelho foi presenteado por empresários que construíram o Campo de Treinamento de Seleções utilizado pela Alemanha, em Cabrália. O sofrimento do jogo rendeu o desabafo de Aderno Pataxó à reportagem de O POVO online: "Esse Brasil só faz a gente sofrer mesmo".
Fonte: O POVO online

29 de junho de 2014

Resistência Krahô

Índios se recusam a deixar fazenda no TO mesmo após decisão judicial

Cerca de 50 indígenas se recusam a deixar fazenda mesmo após decisão da justiça
(Foto: Reprodução/TV Anhanguera)



Fazenda fica localizada em Lagoa da Confusão, no sul do estado.
Justiça deu um prazo de 30 dias para os índios deixarem a área.


Indígenas da etnia Krahô se recusam a deixar a fazenda Planeta, em Lagoa da Confusão, mesmo após decisão da Justiça que deu um prazo de 30 dias para a reintegração de posse. A cidade fica a 350 km de Palmas, no sul do estado. A propriedade foi invadida há um mês, quando cerca de 50 indígenas ocuparam a área alegando que não têm para onde ir.
A fazenda, localizada às margens do rio Formoso, tem cerca de 50% de área preservada. A propriedade tem aproximadamente 11 mil hectares e pertence ao empresário Everardo Telles, que era presidente do grupo Ipyóca. Ele diz que a área é usada para produção agrícola e criação de gado. "Cerca de 50 % é para reserva e 50% de área plantada com capim quicuio e quatro mil cabeças de gado", explica.
Usando flechas e facões eles não deixam ninguém passar da porteira da fazenda, para dentro da propriedade. Eles reivindicam a desapropriação da área que alegam ter direito há décadas. "Antes de 1950 o meu bisavô já morava nessa região. Quando os fazendeiros vieram tiraram ele daqui. Estamos aqui hoje para lutar pacificamente, porque até o momento não ameaçamos ninguém, mas já vieram aqui nos ameaçar", argumenta o vice-cacique Krahô, Davi Reis.
Fazenda fica na Lagoa da Confusão (Foto: Reprodução/TV Anhanguera)
Fazenda fica localizado na Lagoa da Confusão, no
sul do Tocantins (Foto: Reprodução/TV Anhanguera)
O vaqueiro Simael Ferreira Gomes, responsável pela propriedade, morava perto da entrada principal da fazenda. Com medo, preferiu se mudar do local com a família. "Tem 30 dias que saí de casa com minha família. Deixamos a casa fechada com todos os objetos e quando chegamos aqui está desse jeito. Falta os colchões dos meus meninos; um [aparelho de] som; capa de sofá; calças, botijão [de gás]. A geladeira estava toda aberta, arrebentada", conta.
Aloísio Monteiro, supervisor das fazendas do grupo Agropaulo, aponta os prejuízos. "Os animais estão morrendo. Eles [os indígenas] não estão nos deixando fazer o remanejamento. Tem 4,5 mil bois aí e estão caindo. Fora o que eles mataram e levaram a carne salgada para vender lá fora", acusa.
Mesmo com a decisão judicial para que os indígenas deixem a área no prazo de 30 dias, eles não estão dispostos a deixar o local, enquanto não houver uma solução definitiva para o problema, por parte da Fundação Nacional do Índio (Funai).
"Eu sou uma índia Gudarajara. Estamos aqui e vamos permanecer aqui. Daqui para frente nós não vamos. Se vier alguém [tentar nos tirar daqui] pode vir que nós estamos aguardando", diz a indígena Marta Gudarajara.
G1 tentou entrar em contato com a Funai para alguns esclarecimentos, mas as ligações não tiveram retorno.
Fazenda fica localizado na Lagoa da Confusão (Foto: Reprodução/TV Anhanguera)Indígenas afirmam que não irão deixar a área enquanto não exisitir uma solução definitiva para o problema  (Foto: Reprodução/TV Anhanguera)

Falta de estudos sobre indígenas anula lincença ambiental de mina de ouro no Pará

Mineradora canadense Belo Sun quer explorar área

 no rio Xingu, em Altamira, mas perdeu ação na 

Justiça

Belo Sun pretende extrair 50 toneladas de ouro em 12 anos. Foto: Reprodução/Shutterstock
Belo Sun pretende extrair 50 toneladas de ouro em 12 anos. Foto: Reprodução/Shutterstock
Portalamazonia.com

BELÉM - A Justiça Federal publicou sentença em que confirma decisão liminar (urgente), de novembro do ano passado, de suspensão do licenciamento ambiental do projeto Volta Grande de Mineração, planejado pela mineradora canadense Belo Sun para a mesma região onde é construída a hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará. A sentença também anulou a licença prévia expedida para o projeto. A expedição da licença havia sido anunciada pelo Conselho Estadual do Meio Ambiente (Coema) do Pará, em dezembro de 2013.
Assim como na decisão liminar, do juiz federal Sérgio Wolney de Oliveira Batista Guedes, a sentença assinada pelo juiz federal Cláudio Henrique Fonseca de Pina condicionou o licenciamento à elaboração prévia, pela mineradora, do estudo de componente indígena, parte do Estudo de Impacto Ambiental que trata dos impactos do projeto sobre os povos indígenas, seguindo as orientações da Fundação Nacional do Índio (Funai).
Segundo a sentença, as provas apresentadas no processo — iniciado a partir de ação do Ministério Público Federal (MPF) — mostram que é “fato incontroverso” que o projeto causará impactos para índios da região, especificamente para os povos das Terras Indígenas Paquiçamba, Arara da Volta Grande e Ituna/Itatá, “com reflexos negativos e irreversíveis para a sua qualidade de vida e patrimônio cultural”.
“A condução do licenciamento ambiental do multicitado empreendimento sem a necessária e prévia análise do componente indígena acarreta grave violação à legislação ambiental e aos direitos dos indígenas, razão pela qual a procedência do presente pleito é medida que se impõe”, diz a sentença. “Soma-se a isso a circunstância de que as sobreditas terras indígenas também estão sob a área de influência da UHE [Usina Hidrelétrica] Belo Monte, o que exige ainda muito mais cautela na avaliação e dimensão dos impactos do empreendimento em destaque para as comunidades indígenas afetadas”, ressaltou o juiz federal.

Impacto
A Secretaria de Meio Ambiente do Pará, responsável pelo licenciamento, chegou a argumentar na Justiça Federal que os estudos de impactos sobre os indígenas poderiam ficar para fases posteriores, com base na portaria interministerial nº. 414/2011, que estabelece parâmetros com base nas distâncias entre territórios de povos tradicionais e empreendimentos que os impactam. Para a Sema, exigir o estudo indígena seria “penalizar o empreendedor e restringir o desenvolvimento socioeconômico que o empreendimento propõe”.
O juiz Cláudio Henrique Fonseca de Pina refutou. “A referida portaria deve ser vista como parâmetro, e não como norma absoluta, de sorte que, a depender das peculiaridades do caso, os limites nela fixados não serão aplicáveis”. Para ele, no caso da Belo Sun, “a excepcionalidade restou devidamente caracterizada, na medida em que a área encontra-se sob influência de outro empreendimento de elevado porte e impacto ambiental e socioeconômico”.
Exigir todos os estudos é, de acordo com a sentença, “medida de acautelamento e precaução imprescindível para o dimensionamento mais precisos dos impactos a serem causados na população indígena do oeste do Pará, já substancialmente impactada pelos empreendimentos em curso na região”.
O projeto Volta Grande de mineração é anunciado pelos empreendedores como o maior do Brasil. O plano é instalar a mina em Senador José Porfírio, a aproximadamente 10 quilômetros (km) de distância da barragem de Belo Monte. A empresa Belo Sun, do grupo canadense Forbes&Manhattan, divulgou aos investidores que extrairá, em 12 anos, 50 toneladas de ouro.
Entenda o caso
A Funai emitiu, em dezembro de 2012, um Termo de Referência (com as questões a serem respondidas pelos Estudos) para que a Belo Sun fizesse as pesquisas necessárias sobre os impactos aos indígenas que residem na área da Volta Grande do Xingu. Os indígenas que vivem nesse trecho de 100 km do rio Xingu vão sofrer o mais grave e definitivo impacto provocado pela hidrelétrica de Belo Monte, que é a redução da quantidade de água no rio em 80% a 90%.
O impacto é tão severo que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), ao conceder a licença para a usina, estabeleceu um período de seis anos de testes para saber se Volta Grande e as populações terão capacidade de sobreviver à construção da barragem e à seca permanente. A própria Norte Energia S.A, responsável pelas obras de Belo Monte, enviou documento ao MPF pedindo atuação e expressando preocupação com a sinergia entre os dois empreendimentos.
O Estudo de Impacto Ambiental, no entanto, foi aceito pelo Coema sem diagnósticos sobre os impactos nos indígenas e também sem menção à sobreposição de impactos com os de Belo Monte.
No início de 2013, o MPF recomendou à Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) do Pará a não concessão de licença para o projeto da Belo Sun. A Sema respondeu que não poderia “penalizar o empreendedor” e que a licença para a Belo Sun está amparada na “concepção da função social da atividade minerária”. O caso, então, foi levado pelo MPF à Justiça.
O processo tem nº. 0002505-70.2013.4.01.3903. Leia a íntegra da ação e a íntegra da sentença.

28 de junho de 2014

SOS

Funcionários brasileiros alertam sobre morte “iminente” de índios isolados

Especialistas acreditam que os índios fugiram do Peru, em uma tentativa de escapar ondas de madeireiros ilegais que estão invadindo seu território


Avistamentos de índios isolados têm aumentado na região onde índios isolados foram fotografados e filmados do ar há quatro anos.© Gleison Miranda/FUNAI/Survival

Funcionários brasileiros alertaram que índios isolados enfrentam uma “tragédia” e a “morte” iminentes, após um aumento dramático no número de avistamentos na floresta amazônica, perto da fronteira com o Peru.
Especialistas acreditam que os índios fugiram do Peru, em uma tentativa de escapar de madeireiros ilegais que estão invadindo seu território. Agora eles estão entrando no território de outros grupos de indígenas isolados que já vivem no lado brasileiro – e algumas comunidades contactadas.
Índios Ashaninka do estado de Acre, por exemplo, dizem que recentemente encontraram dezenas de índios isolados perto de sua comunidade, e investigações recentes do governo têm revelado avistamentos mais frequentes de pegadas, acampamentos temporários e restos de comida deixados pelos índios.
Estes incidentes estão aumentando os temores de violentos confrontos entre os diversos grupos, e dizimação por doenças contagiosas às quais os índios isolados não têm imunidade.
José Carlos Meirelles, que monitorou esta região para a FUNAI (Fundação Nacional do Índio), durante mais de 20 anos, disse: “Alguma coisa grave deve ter acontecido. Não é normal um grupo deste tamanho de índios isolados se aproximar desta forma. Esta é uma situação nova e preocupante e atualmente não sabemos o que causou isso.”
Os índios foram vistos na mesma região onde índios isolados foram notoriamente fotografados e filmados de um sobrevôo, há quatro anos. Mas a área carece de proteção desde que uma base do governo foi abandonada após ter sido invadida por traficantes de drogas e madeireiros ilegais em 2011.
Índios isolados apontando arcos e flechas na direção de um pequeno avião (fotografados em 2008)
© Gleison Miranda/FUNAI
Os índios isolados são umas das pessoas mais vulneráveis do planeta. Apesar de parecerem saudáveis, eles não têm imunidade a doenças comuns como a gripe e o sarampo, que têm dizimado tribos inteiras no passado.
A FUNAI investigou os relatórios alarmantes dos Ashaninka faz duas semanas. Advertiu que os índios isolados “estão na iminência de um contato” e exigiu que equipes de saúde sejam enviadas para a área urgentemente ou “há risco de contagio por doenças ainda não imunes, podendo levar à morte de todos.”
Raoni Metuktire, um líder indígena da Amazônia, que liderou a luta pela terra da tribo Kayapó e contra a destruição da Amazônia, disse durante sua recente visita à Europa, “Onde podem ir os índios isolados? Sem suas terras protegidas, eles vão morrer.”
Survival International, o movimento global pelos direitos dos povos indígenas, está instando que os governos do Brasil e Peru protejam todas as terras habitadas por índios isoladas e honrem sua promessa de melhorar a coordenação transfronteiriça para salvaguardar o seu bem-estar.
O diretor da Survival, Stephen Corry, disse hoje, “As fronteiras internacionais não existem para tribos isoladas, então o Peru e o Brasil devem trabalhar juntos para evitar que vidas sejam perdidas. Ao longo da história, povos isolados foram destruídos quando a sua terra foi invadida, e por isso é vital que o território desses índios seja devidamente protegida. Ambos os governos devem agir agora para que seus cidadãos isolados possam sobreviver.”
Notas para editores:

- Gravações de audio do relato de um dos Ashaninka que viu os índios isolados estão disponíveis; contate ss@survivalinternational.org
- Veja a nova página web da Survival para a Copa do Mundo sobre “O Lado Sombrio do Brasil” para exemplos do assalto do Brasil sobre os direitos indígenas.
- A Amazônia brasileira e peruana abrigam a maior concentração de tribos isoladas no mundo. A Diretora de Pesquisa da Survival, Fiona Watson, especialista mundial em tribos isoladas, está disponível para entrevistas.

Leia sobre esta história na página da Survival na internet:
http://www.survivalinternational.org/ultimas-noticias/10321

A Survival International ajuda os povos indígenas a defender suas vidas, proteger suas terras e determinar seu próprio futuro. Fundada em 1969, este ano a Survival está celebrando seu aniversário de 45 anos. 
Autor: Survival International
Fonte: Survival International

27 de junho de 2014

Terra Indígena Buriti: apenas 28% estão garantidos até o momento. E o restante, Ministro Cardozo?

Por Tania Pacheco, em Combate Racismo Ambiental
Retomada na Terra Indígena Buriti. Foto: CPT MS
Como o prazo para a homologação se encerra segunda-feira, dia 30, e somente 11 das áreas ocupadas na Terra Indígena Buriti estavam até esta manhã incluídas no Acordo negociado com o Ministério da Justiça, aparentemente os Terena ainda terão que aguardar um pouco mais para receber de volta a íntegra de seu território. Mantendo-se esse quadro, o total a ser liberado através do Acordo soma 2.741,69 hectares aos 2.090 já homologados. Esses 4.831,69 ha equivalem a apenas 28%  da Terra Indígena Buriti: 17.200 ha declarados “de posse permanente” dos Terena através da  Portaria nº 3.079, assinada pelo Ministro da Justiça em 27/09/2010.
Na chamada “mesa de negociação”, o Governo Federal aceitou arcar com os custos de uma perícia judicial para ‘desempatar’ entre os R$ 80 milhões calculados pelo Incra como valor a ser ‘indenizado’ e os R$ 124 milhões pretendidos pelos ruralistas, a partir de relatório da empresa de consultoria por eles contratada. E se comprometeu ainda, caso a perícia definisse valor superior ao estabelecido pelo Incra, a pagar a diferença com novos precatórios, respeitado como teto máximo os R$ 124 milhões da avaliação feita pela Real Brasil Consultoria, em abril deste ano.
Mais: a cláusula sexta estabelece que o valor das “benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé” será pago em até 30 dias após a homologação do Acordo, ou seja: ainda este ano. A partir da data desse pagamento, os ocupantes terão um prazo de 90 dias para retirar bens e animais. Imediatamente em seguida, a “A UNIÃO será imitida na posse das áreas (…) devendo ser realizada vistoria que ateste a existência e o estado de conservação das benfeitorias indenizadas” (cláusula 8ª, § único). Ao mesmo tempo, a cláusula 9ª estabelece que o Povo Terena também respeitará este prazo, no que concerne a possíveis retomadas. 
Na próxima semana, deverá acontecer uma reunião entre representantes dos Terena e o Ministro da Justiça, em Brasília, para definir os novos encaminhamentos. Caberá a José Eduardo Cardozo dizer como agirá em relação àqueles que não assinaram o Acordo, partindo-se da premissa de que os que forem homologados após a segunda-feira, 30 de junho, só terão precatórios liquidados em 2016. Acima de tudo, espera-se que ele informe quais serão os procedimentos do Ministério para devolver os 72% restantes da Terra Indígena Buriti e cumprir não só a Constituição de 1988, com a Portaria nº 3.079. Aliás, essas respostas não interessam apenas aos Terenas, mas a todos nós.
Fora isso, o fato de apenas 11 das 35 ocupações terem entrado no Acordo até o momento, embora suas reivindicações tenham sido atendidas (exceto a que estabelecia a absurda possibilidade de o Governo acatar uma hipotética avaliação judicial ainda superior aos R$ 124 milhões), leva a pensar que o capital esteja apostando alto no poder da bancada ruralista no Congresso Nacional. Só esquecem que a PEC 215 e outras assemelhadas continuarão a ser aberrações inconstitucionais. E assim deverão ser tratadas pelos poderes constituídos, pela República. Leia  também Terra Indígena Buriti: Duas notícias; duas versões para um mesmo (des)Acordo,

Indígenas e a Copa

Foto _ Portal da Copa/Carol Delmazo
Por Tereza Amaral

Longe de querer subestimar as jogadas de Marketinh da presidente Dilma Rousseff e do presidente da Fifa, Joseph Blatter, especificamente envolvendo os povos indígenas e a Copa, a matéria que segue não representa o pensamento do belo mosaico indígena brasileiro. Pelo menos não em sua totalidade, envolvendo as 305 etnias.
Muitos deles questionam e sofreram diretamente com a realização do Mundial no Brasil. Exemplo disso são os indígenas que foram despejados da Aldeia Maracanã.


Em um dos momentos inesquecíveis - e apesar da sonegação da mídia - o jovem Guarani Werá driblou o cerimonial de abertura do evento com uma faixa  que mais se assemlehava a `Bandeira Indígena` apelando pela demarcação. Até o momento nem a Fifa nem o governo brasileiro disseram uma única palavra.
A resposta parece vir através de três jovens indígenas das etnias Tikuna, Xavate e Guajajara que com outros foram contemplados com ingressos para o jogo Coreia do Sul x Bélgica, na Arena Corinthians, em São Paulo.
Um pequenino recorte de uma figura maior...e os que estão nesta última torcem mais pelo respeito ao Direito Indígena que vem sendo desrespeitado pela presidente Dilma Rousseff e seus aliados, sobretudo, a Bancada Ruralista. A matéria abaixo está reproduzida na íntegra, inclusive, com a `barrigada`do total de indígenas no país que são 896,9 mil (IBGE): 

Indígenas acompanham partida na Arena Corinthians em São Paulo



Para Wagner, foi difícil dormir de quarta para quinta. O dia 26 de junho marcaria sua primeira partida de futebol em um estádio: Coreia do Sul x Bélgica, na Arena Corinthians, em São Paulo.
Logo em uma Copa do Mundo e justamente no estádio do time do coração. Ele se soma a muitos outros torcedores que também experimentaram esse momento especial, mas como uma diferença: Wagner representou, no estádio, um dos cerca de 374 (896,9/Censo IBGE) mil indígenas brasileiros.
Ele é Xavante e nasceu no Mato Grosso. Wagner e outros dois mil indígenas receberam ingressos a partir de uma doação de 50 mil tíquetes feita pela FIFA ao governo federal brasileiro. Quarenta e oito mil ficaram com estudantes da rede pública ligados ao projeto Mais Educação.
“Eu fiquei muito ansioso. Isso é um sonho de todos os meus irmãos. Mesmo antes da partida eu já estava me imaginando lá, sentindo a energia” disse, na entrada da arena.
Ele veio de metrô, junto com a esposa Silmara, grávida de cinco meses. Ela é da etnia Guajajara, com origem no Maranhão. As bochechas estavam pintadas de laranja, arte feita com tinta de Urucum, especialmente para vir à partida e fazer parte da confraternização entre diferentes povos, o ponto mais positivo da Copa do Mundo, na opinião dela.
“É um evento de encontro de culturas, você pode viver a diversidade, valorizar a diversidade. E nós indígenas também queremos fazer parte disso. A nossa presença ajuda a quebrar a imagem de que estamos isolados, em outro mundo. Não. Também podemos estar nos centros urbanos, convivendo com todos”, afirmou.
Peixe assado
No caminho para a entrada Oeste da Arena Corinthians, Silmara Guajajara e Wagner Xavante encontraram-se com as irmãs We’e’na e Meme’ena. O primeiro nome quer dizer “onça nadando para o outro lado do rio”. O segundo, “a pata bonita da onça”. Elas são da etnia Tikuna, que está presente no estado do Amazonas. We’e’na casou-se com o cacique Tukumbó Guarani e hoje mora no estado de São Paulo. Mas Meme’ena ainda vive na região amazônica do Alto Solimões, onde, segundo ela, os jogos da Seleção Brasileira sempre reúnem a aldeia, com um cardápio especial.
“Fica todo mundo junto para assistir à Seleção. A gente torce com força, grita, vibra. A gente sempre faz um peixe assado para acompanhar. Nós adoramos futebol, mas lá não escolhemos um time, como Corinthians ou Palmeiras. A gente torce para o Brasil. Quando ganha, é uma festa. Se perde, a gente fica triste, mas entendemos que faz parte, alguém tem que perder em um jogo”, disse Meme’ena, fã de David Luiz e de Neymar.
We’e’na também nutre uma relação muito especial com o futebol e com a Copa do Mundo. “Amamos futebol como qualquer outro brasileiro, e a Copa é incrível porque é um momento de misturar culturas. E é legal ver que os outros povos estão felizes com a nossa recepção aqui no Brasil. Tem que ser assim, confraternizando, mesmo quando se perde. Não tem que brigar, tem que compartilhar alegria e proporcionar união”, afirmou.
Encantamento
A presença dos indígenas diante do estádio causou encantamento na maior parte dos turistas que passaram por eles, sejam brasileiros, coreanos, belgas ou de várias outras nacionalidades. Em menos de uma hora, foram dezenas de pedidos de fotos, todos eles atendidos pelo grupo com simpatia e muitos sorrisos. Mas o estranhamento e curiosidade são mais uma prova da distância que os indígenas sentem, em muitos momentos, do restante da sociedade.
“Estou muito feliz com essa oportunidade porque, na maioria das vezes, a cultura indígena é excluída da socidade. É importante quebrar a imagem de inferioridade. Os indígenas são cidadãos com CPF, RG e título de eleitor. Queremos e podemos participar de momentos como este”, reforçou We’e’na.
Jogos indígenas
Ela e o marido Tukumbó organizaram, em abril deste ano, a primeira edição dos Jogos Indígenas de São Paulo. Na disputa de futebol, os vencedores foram os Guaranis, maior parte entre os 86 índios que ganharam ingressos para a partida entre Coreia do Sul e Bélgica. Entre uma ligação e outra para tentar organizar a chegada do grupo, Tukumbó enfatizou a importância da representação indígena na Copa.
“Isso é histórico. Uma história que ainda não tinha sido contada. Éramos seis milhões quando os portugueses chegaram, 914 etnias. Agora somos apenas 215, cerca de 374 mil indígenas, segundo o último censo. Mas falamos 180 línguas, temos a nossa história e fazemos parte deste país”, disse.
Altura e emoção
Já dentro do estádio, Tukumbó viveu, pela primeira vez, a experiência de torcedor na arquibancada. Em uma frase ele definiu o momento: “Isso vai ficar guardado para sempre no meu coração”.
Perto do cacique, estava Wagner, que perdeu a noite de sono por causa do jogo. Ele teve dificuldade para achar o assento, mas os voluntários o ajudaram. Lá da arquibancada Norte, a primeira coisa que chamou a atencão foi a altura. Demorou um pouquinho, mas ele se tranquilizou. E permitiu-se curtir o momento tão esperado.
“Não sabia que era tão alto. Depois me acostumei. A energia, as pessoas incentivando…fiquei muito emocionado. Talvez não tenha outra Copa no Brasil. E eu estou aqui. Isso me deixa muito contente”, contou.



26 de junho de 2014

Antropólogo dispara sobre causas indígenas: “O preconceito étnico-racial é assustador em Dourados”

Antropólogo Jorge Eremites _ Reproduzida do DN

Dourados News entrevista esta semana, o professor universitário e antropólogo Jorge Eremites de Oliveira, 46. Natural de Corumbá, ele aponta nos questionamentos feitos por e-mail, os principais problemas enfrentados pela população indígena no Mato Grosso do Sul, e em especial, no município de Dourados, onde residem em torno de 13,5 mil pessoas das etnias Guarani, Kaiowá e Terena.
Atualmente morando em Pelotas (RS) – após passar 16 anos como professor da UFMS e posteriormente UFGD – e trabalhando na Universidade Federal do município, Eremites relata, em um dos pontos da conversa, o que considera um desconhecimento significativo sobre quem são os indígenas que vivem na região.
“Isso ocorre porque para muitos eles não são percebidos sequer como seres humanos, quanto mais como Guarani, Kaiowá ou Terena, por exemplo. São vistos como “bugres”, termo racista e recorrente na região”, conta.
No fim, ele opina sobre o poder público e dispara contra o governador de Mato Grosso do Sul, André Puccinelli (PMDB). ‘É o mais anti-indígena desde a criação do Estado’.
Confira a entrevista por Adriano Moretto:
Dourados News – Como você entende a atual situação indígena em Dourados?
Jorge Eremites - A atual situação das comunidades indígenas em Dourados e região é resultado de um processo sócio-histórico bastante complexo e difícil de ser resumido em poucas palavras. No município há uma grande população indígena, distribuída em duas áreas regularizadas e em outras reivindicadas como terra indígena. As áreas regularizadas são a Reserva Indígena Dourados, onde estão as aldeias Jaguapiru e Bororó, totalizando 3.475 hectares, e a Terra Indígena Panambizinho, com 1.274 hectares. A primeira foi oficialmente reservada aos índios em 1917 e ali vive uma população multiétnica estimada em cerca de 13,5 mil pessoas, representantes das etnias Guarani (Ñandeva), Kaiowá e Terena. A segunda foi regularizada em 2004 e naquela área vive uma população Kaiowá de aproximadamente 350 indígenas.
De um modo geral, o desenvolvimento econômico da região está ligado a um processo colonialista de exclusão cada vez maior dos povos indígenas. Sem considerar esta questão, tudo o mais ficará prejudicado em qualquer análise sobre o assunto. No caso em discussão, refiro-me mais especificamente a ações ligadas a um colonialismo interno, aqui percebido como um dinâmico sistema estruturante de relações sociais de dominação e exploração particular ao Brasil, porém conectado a capilaridades transnacionais de um colonialismo global. Este sistema estruturante é marcado por leis, práticas, burocracias, saberes e outros fatores, que caracterizam formas de dominação e manutenção de assimetrias por parte das elites políticas regionais e nacionais contra grupos étnica e culturalmente distintos em relação a elas ou à maioria da população.
O resultado disso tem reflexos em todo tipo de violência perpetrada contra os indígenas que vivem na região da Grande Dourados e em todo o Mato Grosso do Sul, inclusive assassinatos e várias formas de exclusão social e preconceito etnicorracial. Quero dizer, portanto, que minha percepção sobre a atual situação dos indígenas em Dourados e região passa pelo entendimento de contextos mais amplos.
DN – Hoje, os índios estão envolvidos no contexto urbano, a que você atribui isso?
JE - Os indígenas estão envolvidos no contexto urbano tanto quanto as cidades estão envolvidas no contexto indígena. Se isso é bom ou ruim, qualquer resposta plausível tem que ser relativizada no âmbito dessa dialética.
DN – É prejudicial?
JE - No caso de Dourados, a cidade teve origem dentro de um território indígena, embora esta parte de sua história ainda precise ser mais bem conhecida e divulgada a sua população. Se no começo a sede do município ficava um pouco distante da Reserva Indígena homônima, hoje em dia a cidade e a reserva estão umbilicalmente ligadas e não há como separá-las. Para os índios isso se torna um problema à medida que o preconceito étnico-racial e a exclusão social persistem e eles sentem isso no dia-a-dia na cidade. São milhares de sujeitos Guarani, Kaiowá e Terena, os quais seguirão sendo indígenas e não há quaisquer chances de serem totalmente assimilados ou integrados, via aculturação, à “comunhão nacional”. Para a maioria dos não-índios, por sua vez, a marcante presença indígena na cidade de Dourados (e em outras tantas no Estado) é normalmente percebida como algo ruim, uma espécie de entrave ao “progresso” e à “civilização”.
Com efeito, não se deve esquecer que a presença indígena em cidades sul-mato-grossenses se dá porque elas estão em seus territórios e os índios também contribuíram para a construção desses espaços urbanos. Também não se pode pensar que lugar de índio é na reserva porque o lugar deles é onde quiserem estar. Significa dizer que não podem mais ser tolhidos do direito de ir e vir em uma região onde eles próprios são mais que pioneiros; são os povos originários. No caso dos Guarani e Kaiowá, por exemplo, seus antepassados mais antigos chegaram há pelos menos 1.500 anos à região.
O prejudicial nisso tudo, se é que assim podemos chamar, é o racismo que muitos nutrem contra os indígenas.
DN – A sociedade em geral atribui ao indígena uma visão preconceituosa ainda, por quê?
JE - O preconceito que grande parte da população não-indígena de Dourados nutre contra os Kaiowá, Guarani e Terena se deve a um fato curioso: apesar da proximidade e até mesmo da convivência, tenho observado um desconhecimento significativo sobre quem são os indígenas que vivem na região. Isso ocorre porque para muitos eles não são percebidos sequer como seres humanos, quanto mais como Guarani, Kaiowá ou Terena, por exemplo. São vistos como “bugres”, termo racista e recorrente na região. Porém, quando inquirida sobre o assunto, a maioria das pessoas não-índias tende a dizer que não é racista e chega até a apontar soluções das mais controversas para resolver o que considera a “questão” ou o “problema” indígena.
Em Dourados e região o preconceito étnico-racial contra os indígenas é algo assustador para qualquer pessoa de fora que chega à cidade. Este comportamento faz parte das estratégias colonialistas de propagar uma imagem de “bárbaro”, “selvagem” e “bugre” aos Guarani, Kaiowá e Terena. Há até pessoas que dizem que chamá-los de “bugres” não tem nada de preconceituoso. Quando assim dizem, demonstram por si só que o racismo já foi naturalizado na região, algo que é gravíssimo.
Esta situação também se deve ao papel de setores da imprensa local, por vezes mantidos com recursos públicos e pelo próprio movimento ruralista. Por isso sistematicamente divulgam uma imagem extremamente negativa a respeito dos Kaiowá, Guarani, Terena e outros povos indígenas. Esta minha crítica, contudo, não deve ser generalizada porque sabemos do trabalho de profissionais e segmentos da mídia regional que atuam em outro sentido, os quais infelizmente são minoria.
jorge eremites


DN – A Reserva Indígena de Dourados é um ‘barril de pólvora’?
JE - Não usaria a expressão “barril de pólvora”. Diria que a Reserva Indígena Dourados é um termômetro do que é a sociedade douradense e da região da Grande Dourados. Digo isso com todo respeito e admiração que tenho tanto pelos indígenas quanto pela cidade e seus habitantes não-índios. O que ocorre nesta e em outras partes do Estado é algo comparável a um verdadeiro holocausto, indicativo do quando a região precisa ser humanizada.
DN – O que seria necessário para por fim a violência interna?
JE - De um modo geral, a regularização de todas as terras indígenas na região da Grande Dourados diminuirá o ambiente de tensão e violência existente na reserva. Paralelamente será preciso haver uma presença permanente e eficaz o Estado Brasileiro na área em termos de políticas públicas para educação, saúde, saneamento básico, segurança, esporte, transporte, sinalização para o trânsito, enfim. E isso tem que ser feito em atenção às particularidades socioculturais da comunidade multiétnica que ali vive. No entanto, para muitos governantes este é um problema federal. Por isso são poucos os recursos bem aplicados na área, o que aumenta ainda mais a exclusão e, por conseguinte, a vulnerabilidade social das famílias que ali vivem. E quando investem recursos nas aldeias, isso normalmente é feito de maneira equivocada e sem uma consulta prévia à comunidade.
DN – Os conflitos entre proprietários de terra e indígenas tem aumentado, como trabalhar com isso?
JE - Infelizmente não há uma solução fácil para resolver a situação, tampouco tem sido registrado um interesse do governo federal em equacionar o problema sem violar ainda mais os direitos dos povos indígenas. Uma solução seria identificar e delimitar todas as terras indígenas existentes na região da Grande Dourados e no restante do estado. Feito isso, caberia ao governo federal, valendo-se de mecanismos contidos na legislação brasileira e internacional, indenizar à altura a todos os proprietários de boa fé. Regularizar todas as terras indígenas é, pois, o primeiro passo decisivo para resolver os conflitos. Depois caberia um conjunto de políticas públicas com vistas à conquista da autonomia dessa população historicamente excluída. Recursos financeiros para isso não faltam e prova disso são os gastos públicos com a Copa da Fifa e as Olimpíadas no Brasil.
DN – A que você atribui a demora na demarcação de terras, já que boa parte dos estudos para elas já foram concluídos?
JE - A demora constatada na regularização das terras indígenas também se dá por meio de uma política anti-indígena definida e aplicada pelo atual governo federal e seus aliados. Para isso serve muito bem o atual modelo desenvolvimentista nacional, baseado no paradigma do crescimento econômico a qualquer custo. Seguir um paradigma assim tem reflexos negativos na política indigenista oficial. Trata-se de um modelo colonialista que sistematicamente viola os direitos elementares dos povos indígenas e comunidades tradicionais, além de classes sociais em situação de vulnerabilidade social.
O resultado disso é a existência de crises estruturais, com particularidades em cada região do país, dependendo da conjuntura local, como ocorre em Mato Grosso do Sul, onde há muitos conflitos pela posse de terras indígenas. Daí compreender a grande insatisfação atual dos povos originários para com o governo central e seus aliados, seja por conta da construção de empreendimentos que geram exclusão social e outros impactos negativos, seja por conta da não regularização de suas terras.
DN – Quem é o real culpado pela situação?
JE - Diria que as elites políticas e econômicas e o Estado Brasileiro são os maiores culpados pela violação de direitos territoriais dos povos indígenas em Mato Grosso do Sul e em outras unidades da Federação. Isso porque não podemos ser ingênuos e pensar que o Estado é uma entidade sobrenatural onipresente e onisciente.
Enquanto instituição, o Estado esteve por longo tempo exclusivamente nas mãos das elites, inclusive no que se refere a funções importantíssimas no Executivo, Legislativo e Judiciário. Corrigir erros do passado e do presente é importante para reparar danos registrados ao longo do processo de construção do Estado Brasileiro e da sociedade nacional.
DN – Vai continuar morrendo pessoas para que seja resolvida a questão?
JE - Infelizmente tudo leva a crer que mais vidas indígenas serão ceifadas neste holocausto sul-mato-grossense e brasileiro. E isso não significa que os povos indígenas serão extintos ou que a questão fundiária será solucionada no Estado por meio desta estratégia colonialista.
DN – No seu entender, os indígenas precisam apenas de terra?
JE - Os povos indígenas precisam ter de volta parte de suas terras de ocupação tradicional e também necessitam de políticas públicas que reparem os prejuízos registrados durante décadas para que, dessa forma, possam (re) conquistar a autonomia que desejam. Eles não precisam de qualquer terra, sobretudo de terra alheia, mas de um pedaço maior de seu próprio território, das terras que foram usurpadas ao longo do século XX. Necessitam ainda de políticas públicas voltadas à conquista da autonomia que tinham antes e isso não seria um favor do Estado, mas uma compensação por todo o prejuízo registrado até então.
DN – Com a sua experiência de ter ‘rodado’ o país estudando as causas indígenas, existem diferenças entre os índios de MS e de outros Estados?
JE - Em termos socioculturais, os povos indígenas que vivem em Mato Grosso do Sul são distintos em relação à maioria dos povos originários estabelecidos em outros estados brasileiros. No que se refere a problemas enfrentados pelos Guarani, Kaiowá, Terena, Guató, Kadiwéu, Ofaié e outros povos indígenas no Estado, os mesmos são grandes devido, também, ao tamanho da população e ao poder do colonialismo regional.
Ocorre que Mato Grosso do Sul possui a segunda maior população indígena no país, seguramente bem maior que os quase 70 mil apontados em estimativas oficiais mais recentes. Acrescenta-se a isso o fato de o agronegócio ser muitíssimo forte no Estado, mais até do que em outras regiões. Toda esta situação também se deve à antiguidade das frentes de expansão da sociedade nacional na região, especialmente na porção centro-sul do Estado, atingidas por elas basicamente após o término da chamada Guerra do Paraguai (1864-1870).
Afora isso, nota-se que em outros Estados houve governos que se dedicaram mais ao assunto, buscando solucionar certos impasses, inclusive com ajustes nas constituições estaduais, como acontece em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul. Caso bem diferente ocorre em Mato Grosso do Sul, cujo atual governo estadual é o mais anti-indígena desde a sua criação, em 1977.
DN – No seu entender, os organismos de segurança prestam a segurança necessária para a população indígena?
JE - Geralmente as forças policiais não foram e não estão preparadas para isso, embora o policiamento seja uma necessidade na Reserva Indígena Dourados. Em outras áreas, contudo, forças policiais não são necessárias no momento e tampouco têm sido requisitadas por lideranças indígenas ou mesmo pelo Ministério Público Federal.
DN – Existe uma indisposição dos governos com a população indígena?
JE - Quanto a isso não tenho dúvida alguma, conforme observado nas esferas municipais, estadual e federal. Conheço experiências exitosas de governos municipais que atuam em prol da construção da autonomia das comunidades indígenas, mas isso é exceção à regra. Em Dourados, por exemplo, salvo engano o Executivo nunca teve interesse na criação de uma Secretaria Municipal para Assuntos Indígenas, diferentemente do que existe em Dois Irmãos do Buriti e em outros municípios brasileiros.
DN – A não resolução de problemas básicos e de direito para todo o brasileiro como saúde, educação e saneamento básico, deixa a entender que a intenção de governantes é extinguir a população das Reservas próximas a perímetros urbanos, como Dourados?
JE - Se pudessem, certos governantes teriam mesmo aniquilado completamente as comunidades indígenas em Mato Grosso do Sul, especialmente as que estão próximas a cidades. Houve até governante que ousou propor, de maneira inconstitucional e leviana, transformar a Reserva Indígena Dourados em um novo município, como que se livrando do que imagina ser um “problema”. Felizmente governos desse tipo não tiveram e dificilmente terão sucesso neste propósito por conta da capacidade de resistência dos povos indígenas. Cedo ou tarde terão que atender a certas demandas indígenas, ainda que isso tenha que ser feito por força da lei.
DN – Para finalizar, a política de cotas tem incluído a população indígena na sociedade?
JE - Política de ação afirmativa é um tema recorrente nas universidades brasileiras, especialmente a partir da década de 1990, quando debates sobre o assunto passaram a ser mais frequentes e a ter mais visibilidade dentro e fora da academia. Está relacionada a medidas especiais para a correção de desigualdades constituídas historicamente, resultado de descriminação, marginalização, exploração, preconceito e outras formas conhecidas para o estabelecimento de assimetrias entre pessoas e grupos humanos na sociedade nacional. Muitas vezes essas desigualdades foram naturalizadas e por isso mesmo não despertam a atenção de parte da população. Por este motivo ações afirmativas, como as chamadas cotas sociais e étnico-raciais, têm sido adotadas em órgãos públicos, como ocorre em universidades estabelecidas em todas as regiões do país. Geralmente estão voltadas ao acesso e permanência de estudantes negros e indígenas em cursos de graduação, mas aos poucos também começam a ser implantadas, e com sucesso, em cursos de mestrado e doutorado.
Em linhas gerais, quando se fala em ações afirmativas nas universidades públicas, nota-se, de fato, que há experiências interessantes sendo aperfeiçoadas aqui e acolá. No Mato Grosso do Sul, para ser mais específico, a Uems (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) tem acumulado experiências exitosas e feito constantes avaliações sobre dificuldades ligadas à permanência de estudantes indígenas e negros nos cursos oferecidos pela instituição. Na Unemat, em Mato Grosso, também há experiências a ser consideradas, bem como na UFSCar e na FURG, respectivamente em São Carlos (SP) e Rio Grande (RS), apenas para citar outros casos.
Ações afirmativas tendem a ser ampliadas em todo o território nacional, inclusive no que se refere à inclusão de indígenas, como ocorre em concursos para professores, agentes de saúde e em vestibulares realizados em universidades públicas. Cedo ou tarde, portanto, quer por iniciativa própria, quer por força da lei e da pressão dos movimentos indígenas, ações afirmativas tenderão cada vez mais a incluir os povos originários, inclusive na região da Grande Dourados.