São cerca de 300 os índios que estão na Fazenda Fronteira neste
domingo (30), em Antônio João, a 402 quilômetros de Campo Grande. Por
lá, a cena é de desolação após a troca de tiros com os fazendeiros:
índios acuados, sem acesso a comida e dezenas de crianças com fome. Uma delas, de um ano de idade, foi ferida com um tiro de borracha na
cabeça. Um homem, na sobrancelha. Outra índia mostra as marcas pelo
corpo das agressões sofridas. Aos poucos, eles chegam e se abrem para
contar suas histórias e pedir por um socorro: comida.
Imagem printada. Ver vídeo AQUI. |
"Entre as pessoas que “assistiam” a troca de tiros estava o deputado
federal Luiz Henrique Mandetta, vice-prefeito de Antônio João, Antônio
César Flores e um vereador da cidade, não identificado pelos índios."
Mostrados como agressivos, eles estão com medo de procurar a cidade
para comprar ou obter alimento com parentes e amigos. As motos, meios de
locomoção, foram queimadas pelos proprietários rurais. Ao todo, oito
delas foram estragadas no confronto deste sábado.
Uma delas recebeu um tiro no tanque de combustível, para explodir
perto de quem estivesse por perto. Kunhã Poty, que preferiu se
identificar apenas por apelido à reportagem, conta que no início da
tarde chegaram dez caminhonetes na região, atirando.
Entre as pessoas que “assistiam” a troca de tiros estava o deputado
federal Luiz Henrique Mandetta, vice-prefeito de Antônio João, Antônio
César Flores e um vereador da cidade, não identificado pelos índios.
A morte
Semião, que seria o apelido de Valnildo Fernandes Vilhalva, de 24
anos, segundo o irmão do índio, foi morto durante o confronto. Com medo,
ele preferiu não se identificar, mas disse que Semião estava no rio
quando foi atingido.
“Eles (fazendeiros) não acreditaram que tinham matado um de nós.
Fomos atravessar o rio a nado para levar o corpo para eles verem. Ainda
quente, sangrando, ao contrário do que eles dizem, que já estava frio e
morto. Agora nossa luta é provar que ele morreu aqui, ontem, durante os
tiros dos fazendeiros”, relatou.
Pelo Facebook, Mandetta afirmou: “Ouviu-se um tiro numa mata a 800
metros e dez minutos depois os índios trouxeram um corpo que diziam ter
sido alvejado. Me coloquei como médico e fui até o local. O cadáver de
um homem já em rigidez cadavérica foi jogado na estrada”. A reportagem
tentou contato com o deputado, que não atendeu as ligações.
O corpo passa por perícia para atestar a causa da morte. Um boletim
de ocorrência foi registrado no sábado, seis horas após a morte,
afirmando que o cadáver do índio tinah perfurações de bala.
DOF, Força Nacional e Funai
O DOF (Departamento de Operações de Fronteira) e a Força Nacional
permanecem no local, apesar de não haver mais conflito. Eles se recusam a
falar com a imprensa, mas a informação oficial é de que eles estariam
protegendo os índios.
Porém, na cidade, é dito que os índios estariam violentos e ameaçando
os fazendeiros, fato não constatado pela reportagem no local. “Como
vocês podem ver, nós estamos preservando os bois e a fazenda. Não vamos
destruir nada. Nós respeitamos a terra”, afirmou uma das índias. Ainda
segundo os índios, os celulares foram retirados deles pelos fazendeiros.
A Funai, segundo os índios, também não compareceu ao local. Eles
fazem apelo para que a população leve alimentos à sede da Funai, para
que eles sejam repassados às crianças.
A dona da fazenda
A Fazenda Fronteira é de propriedade da presidente do Sindicato Rural
de Antônio João, Roseli Maria Ruiz. A equipe de reportagem tentou
contato com Roseli, e foi informada que ela não está neste momento na
sede do sindicato, onde outros fazendeiros estão reunidos.
A área reivindicada pelos indígenas, de 9.300 hectares, é chamada de
terra indígena Nhanderu Marangatu, e chegou a ser homologada em junho de
2005, pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Mas, à época, o
presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Nelson Jobim, anulou o
ato, a pedido dos fazendeiros. Ler original com Galeria de Fotos de Cleber Gellio AQUI.
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