9 de março de 2015

Taunay-Ipegue: TRF da 3ª Região diz que limite temporal é válido desde que não tenha havido expropriação territorial

audiência-Taunay-Ipegue-3


Por Tania Pacheco

Combate Racismo Ambiental



A comunidade da retomada de Taunay-Ipegue tem ótimo motivo para comemorar: o Tribunal Regional Federal da 3ª Região negou provimento ao agravo de instrumento  através do qual fazendeiros recorriam de decisão da 4ª Vara Federal de Campo Grande e pediam a interrupção do processo de demarcação da Terra Indígena. Essa vitória anterior da comunidade foi conquistada após visita do Juiz Pedro Pereira à área reivindicada, quando pode ver como os Terena estavam cuidando da terra, plantando e recuperando-a.

No seu voto como Relator, o desembargador Paulo Fontes, do TRF, não só concordou com o encaminhamento anterior, como teve atitude que merece ser levada ao conhecimento de ministros do STF. Acatou a citação do processo de Raposa Serra do Sol, mas observou:

“não há como deixar de reconhecer que foi fixado limite de tempo de ocupação para fins de demarcação de terras tradicionalmente indígenas, no entanto, com ressalvas, devendo-se verificar que a reocupação não ocorreu por atos de expropriação territorial praticados por não índios”.

Assim sendo, como diz ainda ele, “não há como impedir o prosseguimento do processo administrativo”.
Abaixo, transcrição do Parecer e do Voto do Relator Paulo Fontes:
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EMENTA
PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE DOMÍNIO – DEMARCAÇÃO DE TERRAS – OCUPAÇÃO INDÍGENA – PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DEMARCATÓRIO – DECRETO Nº 1775/96 – FUNAI – AGRAVO IMPROVIDO.
1. Compete à União Federal demarcar as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios, bem como proteger e fazer respeitar todos os seus bens, conforme norma prevista no art. 231 da Constituição Federal.
2. A demarcação das terras indígenas, conforme disposto no Decreto 1.775/96, deverá ser precedida de trabalho de identificação da área, sob iniciativa e orientação do órgão federal de assistência ao índio (FUNAI).
3. O procedimento de demarcação de terras indígenas tem caráter declaratório, porquanto as terras em que se verifica a ocupação tradicional indígena são desde logo, por dicção constitucional, pertencentes à União e sujeitas ao usufruto exclusivo da comunidade indígena – cabendo ao órgão oficial apenas os estudos antropológicos, a delimitação e demarcação da área.
4. Nestes termos, somente após a concretização dos estudos de natureza etno-histórica, antropológica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e o levantamento fundiário necessários à delimitação, serão fornecidos os elementos necessários para descrever com propriedade a existência ou não de ocupação de terras indígenas na área objeto da lide e demais requisitos no marco temporal previsto para a demarcação de terras.
5. Portanto, imprescindível a continuidade do processo administrativo demarcatório, meio através do qual será possível um juízo acerca da ocupação indígena sobre a área em questão e do consequente domínio da União.
6. E, se da realização dos estudos de natureza etno-histórica e antropológica, evidenciar que a área, efetivamente, se situa em terras indígenas, ao particular que for afetado pelo processo de identificação da área a ser demarcada será assegurado o contraditório e a ampla defesa, com a possibilidade de se manifestar, produzindo todas as provas pertinentes em defesa de seu direito.
7. Por ocasião do julgamento do Pet 3388 / RR – RORAIMA, não há como deixar de reconhecer que foi fixado limite de tempo de ocupação para fins de demarcação de terras tradicionalmente indígenas, no entanto, com ressalvas, devendo-se verificar que a reocupação não ocorreu por atos de expropriação territorial praticados por não índios.
8. Por outro lado, a Constituição incumbe o Poder Executivo da realização dos referidos estudos, não podendo o Poder Judiciário avocar para si tal responsabilidade, em ações movidas por particulares, antecipando-se ao pronunciamento dos órgãos legalmente investidos de tais funções. Realizados os estudos, como dito, poderão os particulares questionar os seus resultados, tanto na esfera administrativa quanto na judicial.
9. Portanto, não há como impedir o prosseguimento do processo administrativo.
10. Agravo de instrumento improvido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
São Paulo, 23 de fevereiro de 2015.
PAULO FONTES
Desembargador Federal

Destaque: foto da audiência na 4ª Vara Federal, em Campo Grande.
Enviada para Combate Racismo Ambiental por Luiz Henrique Eloy.

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