Sobre o crescimento da violência contra os povos indígenas nas últimas semanas, com os chocantes casos da morte do menino Vitor, da etnia Kaingang, assassinado no colo da mãe enquanto era amamentado em frente à rodoviária do município de Imbituba, em Santa Catarina, e de outro indígena não identificado morto também
em uma rodoviária, no centro de Belo Horizonte, espancado enquanto
dormia, o secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário
(Cimi), Cléber Buzatto, afirma ter relação direta com os ataques aos
direitos indígenas promovidos pela bancada ruralista no Congresso
Nacional.
Em entrevista à Rádio Brasil Atual,
o secretário-executivo do Cimi cobra também ações mais efetivas por
parte do Executivo Federal na demarcação de terras indígenas que,
segundo ele, é o elemento central da disputa com os ruralistas, e
lamenta a redução do orçamento previsto para a Fundação Nacional do
Índio (Funai). “Em vez de fortalecer o órgão indigenista, em vez de
aumentar os recursos disponíveis para a solução dos problemas, o
governo, ao contrário, reduziu drasticamente o orçamento para essas
ações”.
Confira a íntegra da entrevista:
RBA
– No acompanhamento desse trato com os indígenas, e também do
preconceito contra os povos, o Cimi tem alguma resposta do porquê do
aumento da violência contra os indígenas?
Cléber Buzatto – Estamos
muito preocupados. Já conversamos em outras oportunidades sobre
situações de violência e essa situação tem se agravado permanentemente
e, nesses últimos dias, se manifestado em casos extremamente graves,
marcantes e revoltantes. Ataques incompreensíveis, para quem tem o
mínimo de humanidade no coração. Ataques gratuitos, onde as pessoas que
morreram, em ambos os casos, não fizeram nada contra os seus algozes e
agressores. Portanto, a violência que eles sofreram diz respeito a um
ódio que está sendo veiculado na sociedade contra um grupo, ou grupos de
pessoas, das quais elas fazem parte, que sofrem essa violência
puramente gratuita. Estamos convencidos de que o aumento dessas
manifestações de ódio, que se traduzem em atos de violência, inclusive
assassinatos, tem relação direta com o ataque que os ruralistas tem
praticado contra os povos indígenas no âmbito do Congresso Nacional, e
em outras instâncias, na tentativa de desfazer os direitos,
especialmente os direitos territoriais, dos povos originários, para
continuar tomando de assalto as terras que pertencem e que são fonte de
vida para os povos originários do nosso país.
Nesse
processo de ataque aos direitos territoriais dos povos indígenas, que
estão consagrados na Constituição Federal, como uma forma de tentar
legitimar a ação desses ruralistas, eles próprios têm adotado postura
extremamente agressiva no seu discurso anti-indígena, em todas as
regiões do país. Discursos, inclusive, de incitação à violência e ao
ódio contra os povos indígenas. É o caso concreto, por exemplo, dos
deputados (federais) Alceu Moreira (PMDB-RS), Luiz Carlos Heinze
(PP-RS), que, no final de 2014, fizeram discursos de incitação ao ódio e
à violência contra as comunidades. Esses discursos têm sido repetidos
por centenas de parlamentares da bancada ruralista de várias regiões do
país, e esses discursos potencializam ao extremo um sentimento de
preconceito que já é latente numa parcela significativa da população
brasileira, a ponto de nesses últimos períodos estar chegando nesses
extremos de assassinatos gratuitos contra pessoas totalmente indefesas.
RBA
– Muitos outros casos também não chegam a público. Como está o
acompanhamento do Cimi da política indigenista do país, ainda precária?
Cléber Buzatto – Exatamente,
tem muitos casos. A gente faz um esforço bastante grande, nossos
funcionários e nossas equipes, de sempre que tomam conhecimento, a gente
procura fazer um esforço para dar visibilidade para estas situações.
Mas, evidentemente, muitos casos acabam não chegando devidamente ao
conhecimento público, e esse é um problema também.
Nós
estamos acompanhando a questão da política indigenista, sempre com uma
preocupação bastante grande, porque, apesar de todas essas manifestações
de preconceito e ódio que estão acontecendo, a gente não vê, por parte
do poder Executivo, uma ação efetiva na perspectiva de combater
estruturalmente essas situações. Ao contrário, ficamos perplexos, há
poucos dias, ao tomarmos conhecimento da redução bastante drástica do
orçamento da Fundação Nacional do Índio (Funai), disponível para ações
como, por exemplo, das demarcações de terras indígenas e indenização aos
ocupantes não-indígenas. É um sinal, segundo a nossa avaliação, de que o
governo não tem uma perspectiva, dentro da sua política indigenista, de
atacar o cerne, o elemento central, que motiva, produz e potencializa
essas situações de conflito, violência e ódio entre os povos.
É
preocupante essa informação de que, em vez de fortalecer o órgão
indigenista, em vez de aumentar os recursos disponíveis para a solução
dos problemas, o governo, ao contrário, reduziu drasticamente o
orçamento para essas ações. Isso demonstra claramente uma opção política
que, infelizmente, não prioriza os povos indígenas, numa perspectiva
economicista que evidentemente a gente discorda.
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