Em audiência pública conjunta de três comissões parlamentares sobre a
construção da Usina Hidrelétrica de Tapajós, chefe dos guerreiros
denuncia a forma criminosa com que o governo brasileiro trata seu povo
Adalto Munduruku discursa em plenário na Câmara dos Deputados (© Julia Moraes / Greenpeace)
Greenpeace
Hoje (ontem, 10.12.2015) foi um dia histórico para o povo Munduruku. O líder dos
guerreiros, Adalto Akay Munduruku, fez parte da mesa de debate de
audiência pública promovida pelas Comissões de Minas e Energia, Meio
Ambiente e de Integração Nacional na Câmara dos Deputados, em Brasília. O
tema é assunto de vida ou morte para essa etnia indígena do Pará: a
construção da Usina Hidrelétrica de São Luiz do Tapajós irá alagar seus
territórios tradicionais.
Para um povo que nunca foi consultado pelo poder público sobre a
construção da hidrelétrica, ter voz em um plenário da Câmara, com a
presença de deputados, foi uma grande oportunidade. E Adalto Munduruku
usou bem seu espaço: “Não queremos a barragem no Tapajós porque não vai
trazer nada de bom para nós. Vamos perder tudo, inclusive territórios
sagrados. Onde nossos espíritos vão descansar? O rio Tapajós vai ficar
sujo, vai trazer peixe contaminado. Estou dizendo porque já vi isso
acontecer no rio Madeira”.
O chefe dos guerreiros também destacou que o povo Munduruku é contra a
construção de hidrelétricas em seu território há mais de 30 anos.
“Falam que hidrelétrica é energia sustentável, limpa. É mentira, é
energia suja. É só olhar os impactos que elas causam”, e completou: “O
governo podia colocar placas solares em nossa terra, porque não atingem o
meio ambiente. No Pará tem muito sol”.
Adalto Munduruku é chefe de todos os guerreiros das 128
aldeias Munduruku no Pará. Para nós, ele seria um general (© Julia
Moraes / Greenpeace)
Sem contar Adalto Munduruku, outros 15 indígenas da mesma etnia
puderam entrar para acompanhar a sessão. Mas cerca de 60 Munduruku
ficaram do lado de fora do Congresso, o que foi fortemente criticado
pelo deputado Edmilson Rodrigues (PSOL/PA). “Me sinto humilhado com o
presidente dessa Casa proibindo a entrada dos indígenas em uma audiência
pública como essa, de alto nível”.
O também paraense Arnaldo Jordy (PPS/PA) foi contundente em seu
discurso: “Não há como ocultar o sentimento de indignação, revolta e
inconformismo. Está tudo errado. É um modelo de produção [de energia]
falido! O progresso e o desenvolvimento a qualquer preço nos proíbe cada
vez mais de ter um olhar humanista baseado nos direitos fundamentais
consagrados na Constituição Brasileira”.
Segundo o deputado Jordy, as hidrelétricas na Amazônia, e
especificamente no Pará, servem para abastecer outras regiões do Brasil.
“82% da energia produzida vai para fora do estado para atender
interesses alheios ao povo impactado. 22% dos paraenses não têm energia.
E ainda querem nos dizer que isto é bom para nós. Ainda querem nos
convencer que aqueles que resistem são contra o Brasil, são contra o
progresso. Vão se catar!”, finalizou ele.
“Tem que confiar”
Além de representantes do Ministério de Minas e Energia, da
prefeitura do município de Itaituba (impactado pela obra) e da
Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Pará, à mesa de debate estava
também Regina Generino, coordenadora geral de Infraestrutura de Energia
Elétrica da Diretoria de Licenciamento Ambiental do Ibama (Instituto
Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).
Representando a presidente do órgão, Marilene Ramos, Generino pediu
para que o Ibama tivesse mais crédito de confiança. “Temos que acreditar
nas instituições do governo, que elas estão fazendo o seu melhor”,
defendeu ela.
“O Greenpeace acredita nas instituições e tem plena confiança de que o
Ibama não terá outro caminho a não ser reconhecer a latente
inviabilidade socioambiental da Usina Hidrelétrica de São Luiz do
Tapajós, dada a magnitude dos impactos que ela pode causar”, disse
Danicley de Aguiar, da Campanha de Amazônia do Greenpeace Brasil.
Território: a luta pelo reconhecimento
Ao fim da sessão, Adalto Munduruku disse: “não fizeram a consulta
[sobre a construção] com a gente. Se viessem falar com a gente, saberiam
o que a gente pensa. Mas não é assim. É uma falta de respeito ao povo
Munduruku”. Olhando para os representantes dos órgãos e ministérios do
governo, o líder guerreiro desafiou: “Vocês sabem disso, porque
estudaram. E mesmo assim atropelam nossos direitos”.
Um clássico exemplo do que diz Adalto é a não publicação pela Funai
do relatório de identificação e demarcação da Terra Indígena Sawré
Muybu, pronta há pelo menos dois anos. O texto do relatório é
contundente ao afirmar que 7% do território em questão seria alagado se
construída a hidrelétrica de São Luiz do Tapajós.
Por iniciativa do deputado Edmilson Rodrigues, a Comissão de Meio
Ambiente realizará uma Audiência Pública na cidade de Santarém ou no
município de Itaituba em fevereiro de 2016 para dar continuidade ao
debate. Ler original AQUI.
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