Foto deputado Paulo Pimenta, no centro _ CDHM |
Assessoria de Comunicação do Cimi
Na
tarde de ontem, dia em que ocorria uma atividade em comemoração ao
aniversário de 20 anos da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM)
da Câmara dos Deputados, o presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ),
impediu os indígenas dos povos Munduruku, do Pará (PA), e Xerente,
Krahô, Avá-Canoeiro, Kanela de Tocantins, Karajá de Xambioá e Apinajé,
do Tocantins (TO) de entrarem para participar da solenidade na qual eram
convidados.
No
início da tarde, os indígenas deslocaram-se até o anexo II da Câmara
dos Deputados, onde ocorria a solenidade em homenagem aos 20 anos da
CDHM, e onde ocorria também a sessão do Conselho de Ética que deveria
decidir – após cinco adiamentos – pela continuidade ou arquivamento do
processo que poderia levar à cassação do deputado Eduardo Cunha, por
quebra de decoro parlamentar ao mentir, na CPI da Petrobrás, que não
tinha contas no exterior.
O
combinado com o presidente da CDHM, deputado Paulo Pimenta (PT-RS), era
que, no início da tarde, 30 indígenas teriam a entrada liberada no
anexo, para participar da solenidade, e que mais tarde, às 18h, quando
uma sala maior fosse providenciada, todos poderiam entrar e participar
da atividade.
Mas o combinado não foi cumprido, segundo a CDHM, por ordem de Eduardo Cunha, que não queria movimentação no anexo em que o processo de sua
cassação poderia avançar. Cunha também determinou que as atividades da
Câmara encerrassem às 17h, e orientou a Polícia Legislativa a não
permitir a entrada de mais ninguém no Anexo II.
Como
resultado, a grande maioria dos 180 indígenas que estavam no local para
participar da solenidade acabou ficando do lado de fora, e menos de dez
indígenas puderam entrar. Durante algumas horas, a maioria dos
indígenas aguardou do lado de fora realizando danças e rituais.
Com
os indígenas impedidos de entrar na Câmara, o presidente da CDHM, Paulo
Pimenta, junto com algumas das pessoas presentes na solenidade,
representantes de órgãos federais e entidades de luta e defesa dos
direitos humanos, deslocaram-se para o lado de fora do Anexo II, onde
puderam realizar um momento de diálogo com os povos indígenas.
“Tínhamos
essa pauta já programada, então eu avalio que foi lamentável, muito
desgastante, de uma forma vergonhosa para a Câmara dos Deputados e o
Congresso”, avaliou Antônio Apinajé.
Informados
que a decisão de deixá-los do lado de fora partira da presidência da
Câmara, alguns dos indígenas manifestaram-se: “Eduardo Cunha, nós
queremos fora. Cunha, fora, o nosso povo quer entrar!”.
Além
de manifestarem seu desagrado com a situação a que foram submetidos,
permanecendo horas no sol, passando fome e sede enquanto aguardavam a
liberação dos portões da “Casa do Povo”, os indígenas foram incisivos ao
apontarem sua preocupação e seu repúdio pela PEC 215, pelo Matopiba, um
projeto de expansão da fronteira agrícola no cerrado capitaneado pela
Ministra da Agricultura, Kátia Abreu, e pela construção de hidrelétricas
em áreas que possam afetar os povos indígenas.
“A
gente quer que essa PEC seja parada, pois ela está nos prejudicando e
está tirando o nosso sossego. Esse tal de Matopiba aí também está
tirando o sossego nosso, porque já vem o desmatamento e, se continuar
desse jeito, daqui mais uns anos, não teremos mata mais, não teremos
mais água, porque já foi tudo destruído”, afirmou uma liderança do povo
Kanela, do Tocantins. “Se acabar com isso aí e tiver só plantação de
eucalipto, cana, de onde nós vamos tirar o sustento das nossas
famílias?”, questionou.
As
lideranças Munduruku que se manifestaram no espaço destacaram que,
embora a CDHM estivesse em comemoração, seu povo não tinha nada a
comemorar. Quando os integrantes da Comissão afirmaram que, depois que
Cunha sair da presidência da Câmara, as portas estarão sempre abertas
para os povos indígenas, Alessandra Munduruku, da Terra Indígena (TI)
Sawré Muybu, questionou: “Será que o Cunha saindo, a Dilma vai ter como
demarcar nossa terra indígena, que está há mais de oito anos esperando?
Nós não queremos barragem nas nossas terras”.
O
povo Munduruku sofre com os planos do governo federal de construir
cerca de 40 hidrelétricas na bacia do Rio Tapajós. A maior das
hidrelétricas planejadas, São Luiz do Tapajós, é tratada como prioridade
pelo governo federal e incide diretamente sobre a TI Sawré Muybu,
colocando em risco o povo Munduruku e suas terras, com a construção de
uma usina que já é marcada de irregularidades. A o relatório de
demarcação e delimitação de Sawré Muybu está pronto há pelo menos dois
anos, mas, por opção política do governo federal, o processo
demarcatório está emperrado na presidência da Funai.
Após
a breve sessão do lado de fora, na qual os indígenas manifestaram-se,
foram aplaudidos e receberam também manifestações de solidariedade, as
pessoas presentes na solenidade retornaram ao interior do prédio.
No
fim do dia, ficou-se sabendo que, graças às manobras dos
correligionários de Cunha, o relator do processo contra ele no Conselho
de Ética da Câmara dos Deputados foi afastado e o processo que poderia
resultar em sua cassação havia voltado praticamente à estaca zero.
Antes
da noite cair, os povos indígenas retiraram-se do local, sem que a
imensa maioria deles tivesse tido a oportunidade de participar de uma
solenidade na qual seus povos, suas lutas e sua diversidade eram
homenageados junto a muitas outras pautas, grupos e lutas ligadas aos
direitos humanos.
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