Índios de Piaçaguera sofrem com a falta de
diálogo entre os órgãos responsáveis pela
recuperação da área
Comissão Pró Índio
Peruíbe (SP) - A Terra Indígena Piaçaguera, localizada em Peruíbe, litoral Sul de São Paulo, foi alvo de exploração mineral por um longo período desde os anos 1950 até 2007. Os impactos dessa atividade para a vida e a cultura dos Tupi-Guarani são sentidos até hoje pela comunidade, que sofre também com a falta de informação e diálogo entre os órgãos responsáveis pela fiscalização e recuperação da área. Os índios souberam este ano, por intermédio da Comissão Pró-Índio de São Paulo, que o Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) apresentado pela Mineradora Vale do Ribeira Indústria e Comércio de Mineração S/A foi aprovado pelo Ibama em 2008 e já se encontra em execução. Tampouco à Funai estava ciente do fato.
Segundo o próprio Ibama, a última vistoria técnica para verificar o PRAD foi realizada em julho de 2013. Os caciques das aldeias enviaram carta à Funai solicitando a paralisação de qualquer trabalho de recuperação até que o plano seja apresentado à comunidade e a revisão do conteúdo seja realizada com a participação das lideranças indígenas, adequando-se ao seu modo de vida e aos seus anseios para o futuro da área. Na carta os índios solicitam ainda que o órgão “intervenha com urgência para impedir que sejam realizadas atividades que venham dificultar ainda mais a vida dos indígenas de Piaçaguera”.
A Pró-Índio vem trabalhando com os índios para documentar os impactos e demandar providências dos órgãos governamentais. "É fundamental que os órgãos federais e estaduais que autorizaram a mineração na terra indígena assumam a responsabilidade pela recuperação da área por meio de um plano a ser definido juntamente com os índios", afirma a Lúcia Andrade, coordenadora da Pró-Índio.
Equipe da Pró-Índio na TI Piaçaguera discute os impactos da mineração (2013 - Foto: Carlos Penteado) |
“Os órgãos não conheciam ou não estavam dando devida atenção ao fato. A Pró-Índio fez um trabalho de buscar as informações relevantes para tratar a questão, sistematizando-as e repassando a esses órgãos para que a recuperação saia de acordo com o desejado pelos índios”, explica Otávio Penteado, assessor de programas da Pró-Índio.
Em dois encontros com a participação da Pró-Índio, o proprietário da mineração, João Lino Abel, negou qualquer possibilidade de revisão do PRAD para garantir a participação dos indígenas. O minerador, inclusive, está tentando impedir os moradores das aldeias de utilizar a porção de seu território que se encontra dentro da área em recuperação. Para os índios está claro a diferença entre as expectativas das comunidades indígenas e a do minerador.
O procurador da República, Antônio José Donizetti Molina Daloia - que moveu uma ação contra a mineradora em 2007 - informou que o MPF enviou ofício à Funai no último dia 20 de fevereiro, solicitando que seja realizada uma reunião entre índios, Ibama, mineradora e Funai, além de técnicos do próprio MPF, para buscar uma solução em relação ao PRAD, após a solicitação dos índios e da Pró-Índio. “Dependendo do resultado desta reunião, vamos analisar as próximas providências a serem tomadas”, disse Molina, em entrevista à Pró-Índio.
O Ibama e a Funai foram procurados, mas não retornaram até o fechamento desta reportagem.
Impactos
Veja imagens áreas do desmatamento causado pela mineração.
Realização: Comissão Pró-Índio de São Paulo
Fotos: Carlos Penteado
"Agora não dá mais pra plantar. Agora aqui enfraqueceu a terra"
Alice, da aldeia Piaçaguera relembra o início dos trabalhos da mineradora: “quando chegaram as máquinas, os índios tinham medo. Nunca tinham visto uma coisa dessas. Desapropriaram a igreja, as casas e a escola. Agora no estrago que ficou, era tudo mato. Tinha muito pé de fruta que as máquinas da mineradora derrubou tudo, pra mandar tudo embora. Os rios eram uma beleza, tinha muito peixe e agora não pegamos nada”.A anciã sente falta da variedade de opções de alimentos que havia nas aldeias. “Antigamente plantava muita mandioca, tinha muita casa de farinha. Eu mesmo cansei de fazer farinha. Então agora não dá mais pra plantar. Agora aqui enfraqueceu a terra. Agora passaram muita máquina e estragou muito a terra”, lamenta.
Segundo a professora e liderança indígena Ita Mirim da Aldeia Tabaçu antes da mineração “a mata era diferente, tinha uma riqueza muito grande de caça e frutos e de plantas medicinais. Então ficamos com poucos recursos nessa parte alimentar e cultural da caça”.
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