12 de novembro de 2017

Portaria de identificação da terra Akroá-Gamella será publicada dia 17, garante presidente da Funai; indígenas mantêm ocupação

Foto _ Renato Santana / Cimi


Por Renato Santana, da assessoria de comunicação - Cimi

O presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), o general Franklimberg Ribeiro de Freitas, trata como irrevogável a decisão pela publicação, no próximo dia 17, da portaria de instalação do Grupo de Trabalho (GT) para a Identificação e Delimitação da Terra Indígena Akroá-Gamella. Durante nova reunião realizada com os indígenas que ocupam há cinco dias a sede da Funai em São Luís (MA), a coordenadora Regional do órgão no Maranhão, Eliane Araújo, levou aos Gamella um documento assinado pelo presidente garantindo a publicação do GT. 
Em assembleia realizada no início da noite desta quinta-feira, 10, os indígenas decidiram seguir com a ocupação até que estejam com a portaria nas mãos - publicada nas páginas do Diário Oficial da União (DOU). “Tratamos como uma vitória, fruto da nossa luta, mas decidimos manter a ocupação porque a postura do Estado, historicamente, é de desfazer num dia o que fez no anterior”, destaca Kum´tum Akroá-Gamella. Na manhã desta sexta-feira, 11, os indígenas liberaram os portões da sede conjunta da Funai com o Incra; a interdição acaba, não a ocupação. 

Conforme o presidente Franklimberg informou aos Gamella, durante conversa telefônica antes das duas reuniões com a Coordenação Regional da Funai, que os recursos utilizados para a realização do GT serão do próprio órgão indigenista. “Decidimos não usar o (montante) que o Governo do Maranhão nos ofereceu. Havia condicionantes que dificultariam o trabalho”, explicou o presidente. Para Diassis Akroá-Gamella, uma pergunta não foi respondida: “Por que só agora, depois de seis meses do massacre que sofremos, a Funai percebeu isso e fez algo XX Só voltaremos para casa com a portaria debaixo do braço”. 

O indígena, durante o massacre sofrido pelos Akroá-Gamella em 30 de abril deste ano, levou três tiros de arma de fogo. Os projéteis ainda estão alojados nas costas, dedo da mão direita e rosto de Diassis. Para ele existe um sentimento de impunidade não só porque os autores do massacre estão livres, mas porque o governo federal nada fez para evitar que num novo episódio de violência ocorra. “Tivemos dois parentes com as mãos decepadas a golpes de facão. No total foram 22 feridos, incluindo crianças. E essa luta não começou agora: pelo menos desde 1979 que o governo nos nega o direito à terra”, explica o indígena que aguarda providências da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) para retirar os chumbos que estão em seu corpo.

Desde segunda-feira, 6, cerca de 100 indígenas dos povos Akroá-Gamella, Tremembé, Krenyê e Gavião ocupam a sede da Funai num complexo de escritórios dividido com o Incra e a Embrapa. Na terça, os indígenas decidiram interditar a entrada para os prédios. Houve tensão e a Polícia Federal foi acionada, mas ao término do expediente de trabalho, às 18 horas, a mobilização liberou a saída dos funcionários de maneira pacífica e conforme o planejado anteriormente. Na quarta pela manhã o presidente fez o primeiro contato com os indígenas e as negociações sobre a pauta reivindicatória tiveram início. 

A ocupação ocorre seis meses depois do massacre sofrido pelo povo Akroá-Gamella. “Conseguimos, dia após dia, encontrar maneiras de seguir adiante na luta pela terra. As ameaças em Viana, Penalva e Matinha só aumentaram depois do massacre. Não é seguro andar pelas cidades e pessoas que identificamos no dia em que sofremos o ataque continuam dizendo que da próxima vez será pior. Cada dia aparece uma nova lista de Gamella marcados para morrer”, conta Maria Gamella.  

Outras reivindicações 

A Funai, por intermédio da Coordenação Regional do Maranhão, criará um Núcleo de Direitos Sociais para atender as demandas dos povos do norte do estado. Os servidores que farão a gestão do núcleo ficará sediados na Frente de Proteção Etnoambiental Awá, em São Luís, a mesma ocupada pela mobilização indígena. Entre os povos contemplados estão o Akroá-Gamella e o Tremembé da Raposa. A demanda era antiga: estes grupos precisam se deslocar ao menos 700 km, até a sede da Coordenação Regional, em Imperatriz, para reuniões e resoluções de problemas. 

Quanto aos Krenyê, a Funai não deu boas notícias. De acordo com decisão judicial, o órgão indigenista está obrigado a adquirir uma terra ao povo, que hoje vive sobre um hectare, no município de Barra do Corda, passando por severas privações de água e alimentação. A área escolhida foi periciada e o proprietário está de acordo em vendê-la. Todavia, a Funai não realizou a compra e o presidente afirmou que não há recursos para efetivar a transação - o custo seria de 14 milhões. Tampouco houve um indicativo se no orçamento de 2018 entrará a despesa. 

Sobre o fornecimento de cestas básicas aos Krenyê, que também conta com determinação da Justiça Federal desde 2012, a Funai alegou que o Ministério do Desenvolvimento Social sofreu cortes de verbas pela atual gestão do governo federal e está inviabilizada de fazer os envios. Todavia, informou que as tratativas seguem em curso, mas sem estabelecer nenhum prazo para a regularização da chegada das cestas ao povo que não consegue plantar por falta de água e, sobretudo por não ter terra.   

O órgão indigenista se comprometeu a abrir o processo administrativo para a regularização fundiária do povo Tremembé da Raposa. O município onde estão alojados estes indígenas, Raposa, fica na Ilha de São Luís. Os Tremembé, de acordo com documentos históricos que datam do período da colonização, sempre tiveram o costume de circular pelas terras do Maranhão a partir Ceará, da região de Almofala, onde há uma terra indígena do povo. Um dos núcleos familiares Tremembé se instalou de forma definitiva em Raposa pouco antes da década de 1950.  

Por essa razão, o número de indígenas em Raposa cresceu e hoje não é estipulado porque o receio de se assumir Tremembé pode colocá-los como vítimas de preconceito. “Mas nos organizamos e hoje lutamos por um território. Crescemos na cultura e queremos seguir com ela, a praticando sobre um chão sagrado. Desde 2003 estamos nessa luta. Em 2014 tivemos um reconhecimento enquanto povo e agora queremos avançar mais”, explica Rosa Tremembé. A Funai afirma que tomará providências para a realização da qualificação de demanda e, em seguida, iniciará o processo de identificação.  

Como grandes empreendimentos estatais e privados têm acossado terras indígenas no Maranhão, um outro ponto da pauta é o direito de consulta, expresso no artigo 6º da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No caso Akroá-Gamella, por exemplo, a Eletronorte pretende passar linhões de energia sobre o território do povo. A Funai, por sua vez, garantiu que apoia o direito de consulta e fará gestão nesse sentido junto ao Estado brasileiro. 

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