28 de agosto de 2017

Com 14% do corpo queimado, indígena se recupera após atentado; os Pitaguary denunciam motivação política no ataque


Montagem de fotos da casa incendiada onde o indígena estava.

Crédito _ Clécia Pitaguary



Por Renato Santana, da Assessoria de Comunicação - Cimi

O estado de saúde de Maurício Alves Feitosa Pitaguary, mais conhecido como Mazin, é estável e sem risco de morte. Na madrugada de domingo, 27, o indígena dormia quando sofreu uma emboscada na vacaria onde trabalha, situada na aldeia Santo Antônio, Terra Indígena Pitaguary, município de Maracanaú (CE). Dois homens incendiaram com gasolina a casa onde Mazin estava. Ao tentar fugir, o indígena foi seguro, espancado e colocado de volta no local, que já ardia em chamas.

Mazin tem 42 anos e está internado no Instituto José Frota (IJF), em Fortaleza, com queimaduras de segundo e terceiro graus em 14% do corpo - concentradas nas costas e no abdômen. O hospital não divulgou um boletim médico, mas conforme os Pitaguary que o visitaram na tarde desta segunda-feira, 28, Mazin está consciente e conversando. "Está tomando banho anestésico, estão colocando curativos, ele está andando bem e se alimentando. Respirando normal. O pior já passou", relata uma indígena que prefere não se identificar. Este ano, em abril, se deu a memória dos 20 anos do martírio de Galdino Pataxó Hã-hã-hãe, que teve o corpo incendiado, em Brasília, por um bando criminoso.

A insegurança resume o momento para as lideranças Pitaguary. Os indígenas estão convictos de que o atentado teve como intuito atingir os Pitaguary, sobretudo os oriundos da família de Mazin, que se opõem a especulações imobiliárias e empresariais no território tradicional - localizado a cerca de 24 km de Fortaleza. "Temos a terra retalhada por esses interesses. Infelizmente alguns indígenas apoiam esses empresários e políticos, a elite local, mas não representam o povo Pitaguary", explica outra indígena que também não será identificada por razões de segurança. A Terra Indígena Pitaguary foi declarada com 1735 hectares, onde vivem 3765 indígenas (IBGE, 2010).

"Retalhada" significa dizer que várias porções do território estão degradadas e invadidas, gerando resistência da parte dos Pitaguary e os mais variados ardis de quem tange os interesses privados nas terras. "Maurício é irmão de uma importante liderança indígena estadual e nacional, a Ceiça Pitaguary, que, em março de 2016, também sofreu um grave ataque (...) Foram desferidos contra ela, vários golpes de facão, que lhe causou muitas lesões nos braços e na cabeça e que por muito pouco não teria sido fatal", pontuou em nota o Observatório Socioambiental, que acompanha a situação dos povos indígenas do Ceará. A indígena Ceiça Pitaguary, que integrou a direção da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) entre 2012 e 2014, realizou inúmeras denúncias em Brasília sobre o assédio de políticos e empresários no território tradicional de seu povo.

Para uma outra importante liderança Pitaguary, não identificada por razões de segurança, o atentado contra Mazin se trata de uma represália. "Na última Assembleia Estadual (dos Povos Indígenas do Ceará, ocorrida no final de julho), uma nota foi feita afirmando essa luta contra os invasores da terra e dizendo que os indígenas que os defendem e estão com esses invasores não representam o povo Pitaguary. Agora esse grupo está perseguindo a Ceiça e a sua família por conta disso. Uma covardia", diz.

Em nota pública divulgada na tarde desta segunda, o movimento indígena do Ceará ressalta que "nos últimos anos, ações criminosas patrocinadas por grupos políticos da região de Maracanaú e Pacatuba, envolvendo inclusive indígenas, têm provocado terror e medo em grande parte das Comunidades Indígenas locais. Episódios de ameaças, cárcere privado, golpes de facão e agora essa brutal ação de incendiar uma casa com um parente dentro só reforça a nossa indignação pela total omissão das instituições". Na nota, o movimento enfatiza que "várias ocorrências" foram registradas em delegacias locais e levadas às autoridades competentes.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) acompanha o caso e ontem esteve com a Polícia Federal na aldeia, onde agentes tomaram depoimentos de indígenas e iniciaram as investigações. Os autores do crime ainda não foram identificados e na manhã desta segunda, lideranças Pitaguary estiveram na Superintendência da Polícia Federal, na capital cearense.

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