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MARIA RITA KEHL, Folha de São Paulo
Damiana agradeceu o modesto socorro que lhe oferecemos e se afastou com a família. É uma mulher miúda, como seus parentes guaranis-kaiowás. No momento, lidera o que restou de sua aldeia: a filha dela, dois adolescentes de idade indefinida e três crianças, além do cachorrinho que só percebi porque ganiu quando alguém pisou nele, no escuro.
O menino de oito anos segurava uma lança um pouco mais alta que ele; o adolescente maior, uma borduna. Será este talvez todo o arsenal de guerra que ainda possuem. Devem saber que as armas não teriam serventia para enfrentar um pistoleiro. Muito menos um bando. Vulneráveis desse jeito -e ainda resistentes. Até o fim. Que convicção sustenta a valentia deles?
Ficamos ainda do lado de fora vendo o grupo sumir na escuridão. Percebi que tinham arrastado uma árvore seca, que até eu sou capaz de remover, para simular um bloqueio à porteira de entrada.
Nosso reforço consistiu em levar lanternas e alguns celulares carregados para que pudessem chamar por socorro -vindo da parte de quem? De nós quatro? Da polícia? -caso os capangas do fazendeiro decidissem cumprir as ameaças que fizeram por três vezes, durante o domingo [10/11].
Do outro lado da estrada, os faróis dos caminhões iluminavam de passagem os fantasmas dos casebres em que eles viviam antes de entrar na fazenda. Se não era para entrarem de volta na terra que o fazendeiro tomara, por que tocaram fogo nas casas dos índios no acostamento?
Essa pergunta é a mais fácil de responder: maldade. Para mostrar quem manda. Além de manchar a perfeição monótona da soja, a simples presença de um acampamento indígena na beira da estrada arranha o sentimento de soberania do fazendeiro. Leia Mais!http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2013/11/1374884-o-fio-que-da-sentido-a-vida.shtml
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