26 de março de 2017

ATL 2017

O Acampamento Terra Livre (ATL) tem como objetivo "reunir em grande assembleia lideranças dos povos e organizações indígenas  do país para discutir e se posicionar sobre a violação dos direitos constitucionais e originários dos povos indígenas e das políticas anti-indígenas do Estado brasileiro” (Apib).


Unificar as lutas em defesa do Brasil Indígena


Pela garantia dos direitos originários dos nossos povos


Contexto

Os povos e organizações indígenas do Brasil, após árduas jornadas de luta que envolveram históricos processos de formação, articulação, mobilização e incansável atuação junto a Assembleia Nacional Constituinte de 1988, com o apoio de parlamentares, personalidades e instituições da sociedade civil, conseguiram que a Carta Magna proclamada em 5 de outubro daquele ano reconhecesse em seus artigos 231 e 232 o direito deles à identidade cultural própria e diferenciada, bem como os seus direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

Ao longo dos anos a efetivação, isto é, a materialização e o respeito a esses direitos, tornou-se cada vez mais distante. As forças políticas e econômicas que dominam o Estado progressivamente se articularam para reverter as conquistas asseguradas pela Constituição Federal; quadro que nos últimos 05 anos tem se agravado, e com maior preocupação na atual gestão do governo de fato, ilegítimo e anti-indígena de Michel Temer.

O direitos indígenas sofrem sistemáticos ataques nos distintos âmbitos do Estado: no Poder Executivo, por meio de inúmeras medidas administrativas, jurídicas e políticas que fragilizam e visam desmontar as instituições como a Fundação Nacional do Índio (Funai) e as políticas públicas voltadas aos povos indígenas, implicando na paralisação da demarcação das terras indígenas, a precarização senão o caos no atendimento básico à saúde indígena, o engessamento da educação escolar indígena, a inviabilização da gestão, proteção e sustentabilidade dos territórios indígenas, entre outros retrocessos.

No poder legislativo, centenas de iniciativas legislativas – projetos de lei, emendas constitucionais, decretos legislativos –, como a PEC 215/00, buscam regredir ou suprimir os direitos fundamentais, originários e permanentes dos povos indígenas assegurados pela Constituição Federal de 1988 e respaldados pela legislação internacional assinada pelo Brasil.

No sistema judiciário, reforça-se a morosidade nos julgamentos em prejuízo dos povos, as reintegrações de posse são rápidas em favor dos invasores de terras indígenas, a criminalização de comunidades e lideranças tem aumentado e há a tendência de reinterpretar o texto constitucional por meio da chamada tese do marco temporal, ou seja, o entendimento de que só é terra tradicional aquela que estava ocupada pelos povos à época da promulgação da Constituição Federal, desconsiderando as remoções forçadas, o esbulho e expulsões sofridas pelos povos indígenas.

Soma-se a essas ameaças a volta da visão tutelar do Estado, a negação do direito de acesso à justiça, práticas de violência e racismo institucional.

Convocatória

Face a esse cenário assustador que na verdade ameaça a existência e continuidade dos povos indígenas, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) convoca aos povos e organizações indígenas de todas as regiões do país para a maior mobilização nacional indígena do ano – o Acampamento Terra Livre (ATL) que será realizado em Brasília – DF, no período de 24 a 28 de abril de 2017.

O objetivo do Acampamento é: “Reunir em grande assembleia lideranças dos povos e organizações indígenas de todas as regiões do Brasil para discutir e se posicionar sobre a violação dos direitos constitucionais e originários dos povos indígenas e das políticas anti-indígenas do Estado brasileiro”.

Durante a mobilização, que prevê reunir cerca de 1.500 lideranças indígenas, estarão em discussão a desconstrução das instituições e políticas públicas voltadas aos povos indígenas; as iniciativas legislativas anti-indígenas que tramitam no Congresso Nacional; a tese do Marco Temporal; a negação do direito de acesso à justiça e a criminalização de lideranças. O acampamento deverá se posicionar sobre a paralisação das demarcações e a falta de proteção das terras indígenas; os empreendimentos que impactam os territórios indígenas; as ações do poder judiciário, a situação da educação e saúde indígena; a legislação indigenista; os temas da mulher e juventude indígena, bem como outros assuntos de interesses do movimento indígena tais como a articulação de parlamentares, advogados e comunicadores indígenas.

Os participantes do Acampamento deverão ainda se mobilizar e manifestar junto aos órgãos e instâncias do poder público envolvidos com a proteção e promoção dos direitos dos povos indígenas e a implementação das políticas públicas que lhes diz respeito.

A APIB disponibilizará as condições de logística, infraestrutura e alimentação para acolher as delegações, cabendo portanto às associações, comunidades e organizações indígenas procurarem junto à sua rede de apoiadores e parceiros meios de transporte para se deslocarem até Brasília. Os participantes não podem esquecer de trazer os seus materiais de uso pessoal (creme dental, sabonete, escova de dentes, talheres, colchonete e agasalhos) e, quem puder, materiais de alojamento (barracas, lonas, cobertores, saco de dormir, redes, mosqueteiros etc).

As delegações serão recepcionadas a partir da janta na segunda-feira, 24 de abril, no local do Acampamento a ser informado em outro momento. As atividades da mobilização acontecerão 03 dias intensos, encerrando no dia 27 à noite. Por fim, as delegações retornam a suas áreas de origem no final do encerramento ou no dia seguinte, isto, é no dia 28 de abril.

Para outras informações, favor contatar a representação da Apib em Brasília, pelo e-mail apibbsb@gmail.com ou pelo telefone (61) 30345548.

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Mobilização Nacional Indígena

* Texto enviado por Luiz Henrique Eloy/Imagem compartilhada Ana Beatriz Lisboa/Facebook

25 de março de 2017

Apib emite Nota de Repúdio ao loteamento de cargos na Coordenação Regional Nordeste 2 e contra o desmonte da Funai


A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib, preocupada com o cenário de ofensivas contra os direitos dos povos indígenas do Brasil, sob o comando de interesses políticos que tem tomado conta de diversos espaços institucionais, vem a público manifestar o seu repúdio contra a medida do Governo Federal em nomear no dia 16 de Fevereiro do presente a Senhora Tanúsia Maria Vieira para exercer o cargo de Coordenadora da Coordenação Regional (CR) Nordeste 02 da Fundação Nacional do Índio (Funai), localizada na cidade de Fortaleza (CE), responsável por assistir aos povos indígenas dos Estados de Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba, conforme Portaria SE/MJSP nº 262, publicada no Diário Oficial da União.

A nomeação ocorreu por indicação do Deputado Federal Aníbal Gomes (PMDM-CE), que mantém relações políticas e pessoais com supostos proprietários de terras retomadas pelo Povo Tapeba. Uma dessas retomadas é objeto de ação judicial em que o Tribunal Regional Federal da 5ª Região determinou o despejo de 67 famílias indígenas da área, estando a comunidade disposta a ir para o enfrentamento. A indicação dessa senhora, configura uma afronta ao movimento indígena brasileiro.

A referida nomeação ocorreu com a intervenção direta do Ministro Chefe da Casa Civil e do Ministério da Justiça e Cidadania, fato que justificou a ocupação da sede da CR Nordeste 2 pelos povos indígenas na semana de 21 a 23 de fevereiro. A desocupação do prédio somente ocorreu após o compromisso do presidente da Funai, Antonio Fernandes Toninho Costa, em garantir que a senhora Tanúzia não permaneceria no cargo. Na última quarta-feira, 15/03/2017, porém, o presidente da Funai, pressionado pelos ministros da Casa Civil e Ministro da Justiça e Cidadania, procedeu à assinatura do ato de posse da referida senhora, em Brasília, provocando uma nova ocupação iniciada no último dia 20 de março de 2017, e que ocorre por tempo indeterminado até que o Governo Brasileiro proceda à exoneração da referida coordenadora regional.

A afronta aos Povos Indígenas da região de abrangência da CR Nordeste 02 acontece num contexto geral de rateio político de cargos, e ao mesmo tempo de desmonte do Estado, das instituições e políticas públicas voltadas aos povos indígenas, ao grau de o governo decidir no dia de hoje, 24/03, o corte de 347 cargos de DAS no órgão indigenista, atingindo principalmente as Coordenações Técnicas Locais (CTLs), o que implica no abandono total das comunidades nos territórios.

A Apib repudia estas decisões e manifesta a sua solidariedade às lutas dos povos indígenas do Ceará bem como à de todos os povos do Brasil que ao longo de mais de cinco séculos de opressão tem resistido bravamente e continuam determinados a lutar pela garantia de seus direitos constitucionais e originários.

Por uma Funai fortalecida e livre do loteamento de cargos!
Brasília – 24 de março de 2017
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib
Mobilização Nacional Indígena

* Material enviado por Luiz Henrique Eloy 

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“Nós somos a terra”

24 de março de 2017

MPF e DPU ajuízam ação para garantir cestas básicas a famílias indígenas de MS


 
Assessoria de Comunicação do MPF/MS em Cimi


O Ministério Público Federal (MPF) e a Defensoria Pública da União (DPU) em Mato Grosso do Sul ajuizaram ação judicial para garantir o fornecimento mensal de cestas básicas a famílias indígenas de todo o estado. O governo estadual e a União têm se negado, reiteradamente, a fornecer alimentos aos índios e está suspenso o cadastramento de novas famílias para o recebimento do benefício.
Leis federais e estaduais obrigam os entes federados a adotar políticas públicas, como o Programa Vale-Renda, para garantir o direito de comunidades vulneráveis à alimentação adequada. Contudo, para o MPF e a DPU, o que se vê em MS é a negativa do poder público, desde 2008, em atender as comunidades indígenas, ora alegando indisponibilidade orçamentária, ora se esquivando da responsabilidade de fornecer os alimentos.
A restrição atinge tantos os índios de áreas “não-regularizadas”, desconsiderados pelo poder público; quanto de terras regularizadas, que não têm acesso ao benefício, já que novos cadastros deixaram de ser realizados. “O sustento dos índios e de suas famílias sempre foi colocado à mercê das 'vontades' desses entes, o que os têm deixado, muitas vezes, desamparados, sem ter o que comer, ou, então, sem a possibilidade de utilizar os poucos recursos financeiros de que dispõem para suprir as demais necessidades básicas, por terem de empregá-los na aquisição de alimentos ou de fazer um planejamento para o consumo destes”, enfatiza a ação.
Insegurança alimentar
De acordo com levantamento da Funai, além das terras regularizadas, há em todo estado 75 acampamentos indígenas e terras de retomada, que abrigam aproximadamente 1750 famílias. Confinados em espaços territoriais pequenos e sem terra para cultivar alimentos, os índios assentados têm como único meio de sobrevivência as cestas básicas. “A falta de regularidade na entrega dos alimentos tem resultado em grave situação de insegurança alimentar e causado prejuízos à saúde dos indígenas, especialmente das crianças”.
Na ação, o Ministério Público e a Defensoria querem, liminarmente, que o estado de Mato Grosso do Sul faça o cadastramento de todas as famílias indígenas, das áreas regularizadas ou não; analise o preenchimento, pelos índios, dos requisitos para a concessão do Vale-Renda; e entregue cestas básicas mensalmente a todas as famílias que dependam do alimento, sob pena de multa diária de R$ 5 mil. Caso o estado não consiga atender todas as comunidades, a União, complementarmente, deve assegurar o fornecimento das cestas.
Ao final da ação, as instituições querem também que a Justiça obrigue os entes federados a manter atualizado, pelo menos a cada 5 anos, o cadastro das famílias indígenas de MS, de modo a analisar periodicamente o preenchimento dos requisitos para a concessão dos benefícios e garantir a segurança alimentar dos indígenas necessitados.

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Referência Processual na Justiça Federal de Campo Grande: Autos nº 0001975-84.2017.403.6000

20 de março de 2017

Estado brasileiro é julgado em Corte internacional por violações dos direitos humanos do povo Xukuru

É a primeira vez que o Brasil é julgado por desrespeito aos direitos dos povos originários




 Assessoria de Comunicação do Cimi e Justiça Global

O Estado brasileiro será julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos pela violação aos direitos humanos do povo Xukuru - cujo território fica em Pernambuco - nesta terça-feira (21). É a primeira vez em que o Brasil estará no banco dos réus numa corte internacional por violações de direitos de povos indígenas. A audiência de julgamento, na qual serão apresentadas as alegações dos representantes das vítimas e do Estado, acontece na Cidade da Guatemala, a partir do meio dia (horário de Brasília).
A corte analisará a violação do direito de propriedade coletiva do povo Xukuru, do direito às garantias judiciais e proteção judicial e do direito à integridade pessoal, todos previstos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário. Todas estas questões estão relacionadas diretamente à demora do Estado brasileiro em garantir o direito do povo Xukuru de Ororubá à demarcação de sua terra tradicional.
Entre o início do processo de demarcação, em 1989, e a homologação da Terra Indígena Xukuru, em 2001, transcorreram-se 12 anos. Desde então, o Estado ainda não concluiu a desintrusão total da área nem garantiu a posse da totalidade do território aos indígenas, que ainda sofrem com a presença de posseiros na terra demarcada.
O caso é ainda mais significativo porque o problema se arrasta praticamente desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, que teoricamente deveria garantir os direitos dos povos indígenas, e foi marcado por grande violência e pela criminalização dos indígenas. Entre 1992 e 2003, cinco indígenas Xukuru foram mortos diretamente em função da luta pela terra, que vitimou até um procurador da Fundação Nacional do Índio (Funai).
“Esse julgamento traz a possibilidade de uma reparação histórica do processo de luta do povo pela demarcação, que custou muitas vidas. O Estado tinha todas as condições de fazer avançar o processo administrativo, sem que tivéssemos que expor nossas lideranças à luta e sem que precisássemos sofrer com os assassinatos, a violência e a criminalização, mas não cumpriu com suas obrigações”, afirma o cacique Marcos Xukuru, que acompanhará o  julgamento na Guatemala.
Vítima de um atentado que resultou na morte de outros dois indígenas em 2003, Marcos Xukuru é filho do cacique Xikão Xukuru, importante liderança assassinada em 1998.
Histórico do processo
O caso dos Xukuru foi denunciado à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) em 2002. No relatório de mérito do caso, divulgado em julho de 2015, a CIDH conclui que o Estado brasileiro é responsável pelas violações de direitos do povo Xukuru e faz recomendações ao Estado brasileiro, não cumpridas até hoje.
Por isso, em março de 2016, a CIDH decidiu submeter o caso à Corte Interamericana. São representantes do povo Xukuru na Corte Interamericana o Movimento Nacional de Direitos Humanos (MNDH)/Regional Nordeste, o Gabinete de Assessoria Jurídica às Organizações Populares (GAJOP), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e a Justiça Global.
A audiência desta terça será a primeira e única durante todo o julgamento do caso. Depois dela, os representantes das vítimas e os representantes do Estado ainda têm até o dia 24 de abril para apresentarem novas alegações, por escrito, para que então a corte emita sua sentença sobre o caso, condenando ou absolvendo o Brasil das acusações.
A luta dos Xukuru é um exemplo emblemático dos desafios enfrentados pelos povos indígenas de todo o país, e o julgamento na Corte Interamericana representa também um reconhecimento internacional do agravamento das violações aos direitos dos povos indígenas no Brasil.
“Muitos povos indígenas do Brasil esperam vinte, trinta anos enquanto os processos de demarcação se arrastam e resultam em situações de violência e criminalização”, avalia o cacique Marcos Xukuru. “Há um conjunto de ações do Estado brasileiro que inviabilizam a reconquista de nossos territórios e a efetivação de direitos que temos garantidos. Sem voz frente ao Estado, ficamos numa vulnerabilidade muito grande. Não vemos outra maneira de resolver, a não ser pela pressão internacional”.
Histórico do caso
A Serra do Ororubá, em Pesqueira (PE), município encravado no Vale do Ipojuca, é o cenário de um contexto com mais de três séculos de espoliação e morte do povo Xukuru. Mas, nos anos 1980, essa trajetória começou a mudar. Com a nomeação de Xikão como cacique, os Xukuru se articularam e, após quase 20 anos de luta, em 2001, conseguiram a homologação dos 27.555 hectares em que vivem. Essas mesmas terras que já viram tanta morte abrigam, hoje, mais de 11 mil indígenas que lutam diariamente contra o preconceito e a violência para manter sua cultura viva.
Com o fim do regime militar e a transição democrática, a Constituinte de 1988 tornou-se o centro da luta do movimento indígena. Em Brasília (DF), Xikão e outras importantes lideranças indígenas e entidades indigenistas percorreram gabinetes, arregimentaram apoiadores, discutiram propostas, organizaram manifestações e, no final, viram entrar na nova Constituição o direito dos povos originários a suas terras tradicionais.
A vitória trouxe ânimo e, em 1990, os Xukuru iniciaram a retomada de partes de seu território tradicional, enquanto aguardavam a demarcação de sua terra pelo Estado. No decorrer dos anos 90, frente ao atraso da demarcação, uma sucessão de retomadas levou os fazendeiros a reagir. Em 1992, Pajé Zequinha teve o filho assassinado e, em 1995, o advogado da associação, Geraldo Rolim, também procurador da Funai, foi morto a tiros pelas costas.
Xikão sempre acreditou que a base da mudança de seu grupo estava na educação e na organização. Promoveu a criação de comissões de saúde e educação nas aldeias e da Associação do Povo Xukuru – sistema que funciona até hoje e estimula a participação dos indígenas nas decisões do grupo, geralmente discutidas em assembleias e seminários. Na manhã de 20 de maio de 1998, Xikão saía de casa, no bairro Xukuru, em Pesqueira, quando percebeu a chegada de um pistoleiro. Não teve chance de defesa. O assassinato teve repercussão internacional e mobilizou seu povo. Três anos depois, o líder da aldeia Pé de Serra, Chico Quelé, foi assassinado.
No dia 7 de fevereiro de 2003, com a terra Xukuru homologada há dois anos, a história mais uma vez se repetiria. Uma emboscada contra o cacique Marcos, filho e sucessor de Xikão, resultou na morte de dois indígenas responsáveis por sua segurança. Ao saber do atentado, os Xukuru decidiram reagir. Na véspera do carnaval daquele ano, um rastro de fumaça no céu indicava que a Vila de Cimbres havia sido retomada pelos Xukuru, 300 anos depois de construída em território sagrado indígena pelos colonizadores portugueses.
Criminalização
A reação dos Xukuru resultou na condenação de 35 indígenas, entre eles o cacique Marcos,  a quatro anos de prisão. As investigações e denúncias afirmam que Marcos armou o atentado e a morte de dois indígenas para aguçar a revolta do seu povo e a saída das famílias não índias da vila. O mesmo ocorreu nas investigações dos assassinatos do cacique Xikão e de Chico Quelé, pelos quais foram culpados indígenas Xukuru. Dezesseis anos depois da homologação da Terra Indígena Xukuru, o Estado brasileiro ainda não garantiu a desintrusão total dos invasores da área.
Fotos
(1) Cacique Marcos Xukuru (ao centro) está na Guatemala para acompanhar o julgamento. Pajé Zequinha, cujo filho foi assassinado em 1995, fala ao microfone. foto: Renato Santana/Cimi
(2) Povo Xukuru desce a serra de Ororubá no dia 20 de maio, em memória à data em que o cacique Xikão foi assassinado. foto: Renato Santana/Cimi

18 de março de 2017

Cacique Ládio Veron busca apoio político na Europa

Imagem Printada _ Congresso Nacional/Madri



Por Tereza Amaral 
com Bia Morais

Enquanto o agronegócio brasileiro despenca de 'pop para podre' na Operação Carne Fraca , o chefe indígena Guarani-Kaiowá Ládio Veron, que teve o pai barbaramente assassinado, em 2003, e quase virou "churrasco humano" - o agrocrime  no mesmo dia tentou incendiá-lo vivo no Mato Grosso do Sul - começa pela Espanha uma turnê  na Europa que segue até junho.

Com uma agenda em andamento desde a última segunda-feira, o cacique da Terra Indígena Taquara já foi recebido  por políticos, membros da Anistia Internacional de Madri, na Embaixada da Palestina naquele país e aplaudido numa comissão do Congresso Nacional. A viagem tem como objetivo formar uma rede internacional de apoio aos povos Guarani-Kaiowá. 

Em longa entrevista concedida ao El País, Ládio reafirmou que seu povo lutará até o fim e denunciou estratégias anti-indígenas do atual governo. "Estamos passando por um momento difícil, enfrentando muitas dificuldades por parte do governo (Temer) e do agronegócio. Nossas terras foram devastadas e tomada pelas propriedades dos latifundiários". Ler aqui.

A viagem do chefe indígena coincide com o escândalo da Operação Carne Fraca que pode chegar em seu estado, uma vez que as empresas JBS e BRF, ambas investigadas, atuam no Mato Grosso do Sul. A sua ida para a Europa foi organizada pelo Tribunal Popular: O Estado Brasileiro no Banco dos Réus e poderá ser acompanhada na página da Rede Social Facebook Viagem do Cacique Ládio Veron Europa.  

17 de março de 2017

“Carne Fraca”: JBS foi maior doadora de campanha de Osmar Serraglio

Ministro da Justiça chamou líder da organização criminosa, na definição da PF, de “grande chefe”; confira as conversas gravadas pela Justiça


De Olho nos Ruralistas 

 O ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB-PR), aliado de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e nomeado a partir do lobby da bancada ruralista, aparece em interceptação telefônica da Polícia Federal feita na Operação Carne Fraca , a maior operação da história da instituição, que tem como alvos empresários do agronegócio.


O grampo interceptou a conversa de Serraglio em fevereiro do ano passado, quando era deputado federal pelo PMDB paranaense, em conversa com Daniel Gonçalves Filho, ex-superintendente do Ministério da Agricultura no Paraná e descrito pela PF como “líder da organização criminosa”.

O deputado procurou Gonçalves para obter informações sobre uma fiscalização no Frigorífico Larissa, do empresário Paulo Rogério Sposito, conhecido como Paulinho Larissa, candidato pelo PPS à Câmara nas eleições de 2010.

“Em conversa com o deputado Osmar Serraglio”, informa a Justiça Federal, “Daniel é informado acerca de problemas que um Frigorífico de Iporã estaria tendo com a fiscalização do Mapa (o frigorífico Larissa situa-se na referida cidade)”.

Veja abaixo a conversa interceptada pela PF:
O diálogo:

Osmar: Grande chefe, tudo bom?

Daniel: Tudo bom?

Osmar: Viu, tá tendo um problema lá em Iporã. Cê tá sabendo?
Daniel: Não.
Osmar: O cara lá….que o cara que tá fiscalizando lá…aprovou o Paulo lá…disse que hoje vai fechar aquele frigorífico… botô a boca.. deixou o Paulo apavorado. Mas para fechar tem o rito, não tem? Sei lá…como funciona um negócio deste?
Daniel: Deixa eu ver o que está acontecendo.. tomar pé da situação de lá…falo com o senhor.



Segundo a PF, logo após a ligação, Daniel Gonçalves ligou para Maria do Rocio, fiscal na região implicada na operação. Ela responde que não há nada de errado. Gonçalves repassa as informações para Serraglio.

O delegado da PF Maurício Moscardi Grillo disse ao R7 que o deputado não foi grampeado, mas apareceu nas interceptações feitas no telefone de Gonçalves. Como Serraglio era deputado quando apareceu no grampo, “não poderíamos avançar em nenhuma investigação”, disse o delegado.

Mesmo assim, Grillo confirmou que o diálogo foi “encaminhado ao procurador-geral da República […] para que não houvesse dúvidas sobre a investigação e a legalidade do que estava sendo apurado”.

JBS, a maior doadora

Serraglio declarou ao Tribunal Superior Eleitoral, em 2014, um patrimônio de R$ 5,4 milhões. Os bens mais valiosos estão ligados ao mercado imobiliário. Imóveis rurais, ele declarou dois. Um de 24 hectares em Nova Prata do Iguaçu (PR), por R$ 5.966,54, e outro em Umuarama (PR), que ele possui desde 1976, por R$ 409, 20. Em 1997 o deputado possuía R$ 704 mil.

A maior doação feita legalmente para Serraglio, em 2014, foi do frigorífico JBS, uma das empresas investigadas na Operação Carne Fraca, com um aporte de R$ 200 mil.

O deputado paranaense também ficou conhecido por defender o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no ano passado, ao pautar recursos que poderiam anular o processo contra seu aliado no Conselho de Ética. Quando Cunha foi finalmente preso, Serraglio lamentou: “É a queda da República!”


Osmar Serraglio é aliado de Eduardo Cunha (Foto: Alex Ferreira/ Câmara)


Outro lado

Em nota, o Ministério da Justiça diz:
Se havia alguma dúvida de que o Ministro Osmar Serraglio, ao assumir o cargo, interferiria de alguma forma na autonomia do trabalho da Polícia Federal, esse é um exemplo cabal que fala por si só. O Ministro soube hoje, como um cidadão igual a todos, que teve seu nome citado em uma investigação. A conclusão tanto pelo Ministério Público Federal quanto pelo Juiz Federal é a de que não há qualquer indício de ilegalidade nessa conversa gravada.